quinta-feira, 30 de junho de 2011

Navegando Bonito - Mabel Veloso

Edu, penso que ser marinheiro de primeira viagem é uma delícia. Sai pelo azul do mar sem saber o que será depois da primeira onda, da primeira espuma, do primeiro porto. Sai...


Você está assim navegando bonito. Ouvi e vi Judite com você e agora li junto, e olhei longe e vi a sua viagem, a viagem de Judite a viagem de tanta gente, a viagem de todos nós.

Gostei da idéia do livro e espero conhecer em breve "o retrato" feito por Caio. Não encontrei nada a corrigir ou mudar no seu texto. Saiu pronto como saem as borboletas dos casulos.

Dinorah e Paloma são de muita sorte por você viver perto delas, com elas, nelas... O comigo-ninguém-pode aí é "Comvocês ninguém pode"!

De cá recebo a minha fatia de sorte por você lembrar de mim e falar das minhas viagens

com tanto carinho. Desejo boa sorte sempre. Sucesso!!! Um beijo
Mabel


quarta-feira, 29 de junho de 2011

A cagada de Myriam Rios

Seis dias sem entrar no blog e parece uma eternidade. Que vício, que necessidade é essa de escrever aqui, publicar pensamentos? Que loucura!

O mundo anda muito estranho e tudo acontece numa rapidez tamanha que se ficamos poucos dias sem comentar, já estamos ultrapassados, o tema agora já é outro. Não que sejamos obrigados a comentar nada, mas gosto de refletir sobre as coisas, sobre o mundo.

Esta semana foi sucesso na internet e nas rodinhas a "cagada" de Myriam Rios. A atriz, deputada estadual pelo Rio de Janeiro, católica, próxima a Deus, se achou no direito de falar as maiores atrocidades sobre os homessexuais. Insinuou que se contratasse uma babá e esta demonstrasse que ser lésbica, quem sabe poderia cometer o crime da pedofolia em suas filhas, isso porque queria dizer não à PEC 23/2007, que transformaria a homofobia como uma das formas de discriminação. Para a cristã, essa lei impediria que a tal "babá pedófila" fosse demitida caso agisse contra as meninas.

Eu vou e volto, será que eu sou o louco ou o que? Porque não é possível que uma pessoa que tenha as faculdades mentais em seus devidos lugares compreenda que uma lei dessa seja para defender pedófilo, ou mais ainda, alguém pare para pensar em pedofilia ao ler esta lei. Sinceramente! Já que se falou nisso, porque a própria missionária não vai à tribuna e exige que os padres, freis ou sei lá o que de sua própria igreja que cometem costumeiramente absurdos sexuais com crianças sejam punidos? E não são apenas os homossexuais como ela pensa, os depravados, existem os machos que estupram meninas, mulheres, agridem as fêmeas porque são eles que na hierarquia da natureza detém mais poderes. O que é isso gente? E contra ela nada? Enquanto isso centenas de gays são mortos pela intolência, ignorância de muitos, outros tantos são humilhados, espancados em casa e nas ruas por pessoas que se acham superiores aos outros simplesmente porque se incomodam com quem você dorme ou o jeito que você ama. Aliás, AMOR.... São tantas atrocidades em nome desse negócio, né? E pelo AMOR a um certo DEUS então.... Ele mesmo me livre e guarde.

É uma pena que seu nome tenha sido cogitado ou já está certo para encarnar Irmã Dulce no cinema. Coitada da freira/santa baiana! |Com um "cão" desse vestindo sua persona, vai ficar bastante contrariada aonde quer que esteja, pois manchar uma imagem assim, sem direito de defesa, de escolha... não há santo que aguente.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Leite de Onça e as ruas

São João passou por aqui?

Era uma pergunta frequente nas noites da véspera do festejo junino. Entrávamos de porta em porta comendo e bebendo nas casas da Rua C, na Nova Santo Amaro. Bairro pequeno onde construímos nossas maiores e mais antigas amizades. Bebíamos Leite de Onça, um licor feito da mistura de leite condensado e amendoim. Éramos muito novos para beber, mas não havia esse julgamento na época. As pessoas, enlouquecidas, serviam para nossa turma de 11 a 14 anos, em média, tudo que estava na mesa e dali seguíamos para a vizinha, até percorrer, praticamente todas as ruas que iam da letra A a K. Lógico que nossos pais não gostavam que bebêssemos nessa idade, nem apoiavam, mas a intenção não era a bebedeira, saíamos para curtir juntos o São João, como mandava o figurino. E era uma alegria só. No outro dia estávamos, criancinhas inocentes novamente sentados na porta da rua, soltando chuvinhas, vulcões, cobrinhas, comendo bolo e chupando laranja.

Este ano faremos a festa no dia mesmo do santo e por isso esqueci que a Rua C já deve estar em festa, toda enfeitada, cheirando a fumaça e as crianças de lá gritando atrás dos foguetinhos.

Aqui, em Sampa, alegria pipocando com encontro de amigos. Lua de mel na sexta edição. Sentindo cheiro de fogo, licor e as cores... tudo dentro e misturado, como o leite condensado e amendoim de antigamente.

E como será que o meu pequeno está se divertindo na Rua do Imperador?

Fico lembrando da turma da Rua C, na Nova Santo Amaro, todas as crianças brincando na fogueira, queimando chuvinhas, cobrinhas e vulcões no São João. Eu e minha irmã em conjunto de moletom de uma única co

terça-feira, 21 de junho de 2011

Sempre volto à criança e aos Caios

Sempre repito esta frase: Meu Peter Pan anda brigando com meu Menino Maluquinho.

O primeiro se recusa a crescer e o segundo, quando cresceu descobriu que foi uma criança feliz. Para mim foi difícil compreender o mundo adulto, Judite foi criança para me ajudar a diferir tudo isso. Em épocas onde o mundo grita coisas ruins ao meu ouvido, me recolho em Peter Pan e deixo a tempestade passar.

Ontem brincando com meu sobrinho de 3 anos, tive momentos de extrema felicidade, de lembranças das brincadeiras e de como meu olhar brilhava. Eu não via o brilho, mas sentia as faíscas saindo a cada descoberta e a cada besteirinha que se tornava grande, da maior importância. Sentado na porta de casa, com conjunto de moleton novo, soltava as cobrinhas e chuveirinhos de São João. O olho ardendo de fumaçava e o coração pulando de alegria.

Hoje ele me pediu para ler um livro para criança. procurei na minha estante e peguei, sem muito pensar, o livro "Caio" da Série Nomes, da Turma do Fala Menino, criada por Luis Augusto. Caio é o amiguinho que anda de cadeira de rodas e me ensina muita coisa toda vez que abro suas páginas. Meu sobrinho, sem saber, me tirou a tempestade que teimava cair nesse dia de sol.



"A vida é assim mesmo. Temos que aceitar as diferenças, nem toda cadeira nasce com rodinhas."
Caio

Mas quando a criança me falta, volto a Caio Fernando Abreu: “Sem pensar em mais nada, fecho os olhos para esquecer. Dorme, menina, repito no escuro, o sono também salva. Ou adia." Caio F.

domingo, 19 de junho de 2011

Minha transgressão, raiva e cansaço

Há uns dias assisti ao programa de entrevistas Provocações, apresentado por Antônio Abujamra. Ele perguntava auma entrevistada o que tinha feito de mais transgressor na vida. Esta pergunta me chamou logo atenção e não lembro da resposta da convidada porque fiquei refletindo sobre as minhas transgressões. Eu achava que tinha feito muitas, comecei a lembrar de coisas, aprontes, pensamentos, mas logo percebi que nada era tão transgressor assim que pudesse responder ao entrevistador. A não ser o fato de ter escolhido a vida. Então achei a resposta para a questão: VIVER é o meu ato mais transgressor. Afirmo isso com todas as letras porque vivo num mundo que me diz o contrário, me estimula à não-vida, ao não-mundo. Sem acessibilidade e sem acesso às coisas como viver? É como se dissessem: oh meu filho, agradeça porque você respira, se contente com isso, fique em casa tomando remédio, assistindo à sua tv e nos deixe em paz, quietos. Você aqui nos atrapalha. Digo o mundo porque em nenhum lugar que já visitei é possível eu exercer a liberdade de forma plena. Paris, Lisboa, Buenos Aires, São Paulo... em nenhuma cidade dessa (nem conta as pequenas) há uma consciência sobre acessibilidade.  Umas com mais outras com menos, mas nenhuma completamente acessível. Eu teimoso e sem querer pensar na possibilidade de me excluir, insisto em me colocar na vida de forma plena, como uma postura política, como uma postura de luta, de briga, como escolha de vida.

Todo mundo quando vai sair para encontrar amigos ou paqueras, assistir a um espetáculo, beber um pouco com a turma, fazer uma noitada, se preocupa com o que vai usar, quer se fazer bonito para se sentir bem. Eu, além da roupa, tenho que pensar no arsenal que levarei à rua porque é certeza ter que lutar, o mínimo que seja, para que a noite seja proveitosa, para curtir o que me é direito.

Ontem esqueci e sai desarmado. Fui à Mouraria com uma amiga querida, companheira de tantas coisas, de perrengues até em Paris. Sentamos numa mesa na rua e conversamos animadamente, torcemos pelo futebol, falamos besteiras e tomamos cerveja. Como é sabido, cerveja é uma bebida diurética, poucos copos depois veio a vontade de ir ao banheiro. Nenhum bar do lugar (que pertence a mesma dona) tinha banheiro adaptado, para mim nem precisava seguir as regras (exigências de lei), mas que tivesse uma porta larga que a cadeira de rodas pudesse entrar. Eu já não aguentava mais de vontade e me dirigi a uma árvora para poder fazer minha necessidade. O bar fica atrás do Quartel da Mouraria. Quando acabei o "serviço" um militar colocou o rosto na janela da guarita e me repreendeu, dizendo que eu não podia ter feito aquilo. Expliquei a ele que em tese eu não deveria fazer, que sei que existe uma lei que combate este ato, mas que também existe uma lei que exige que todos os estabelicimentos tenham acessibilidade para pessoas com deficiência. Diante disse o que ele me indicaria a fazer? Ele despreparado completamente, me disse que não sabia onde eu podria ir, mas que eu não iria repetir aquilo. Minha amiga chegou e questionou a ele, criticando sua atitude. Ele então, bastante agressivo nos gritou:

- Olhe DESGRAÇA, eu disse que ele não vai mais fazer isso!

Saimos rápido porque sabíamos que uma pessoa dessa não é capaz de dialogar ou entender as situações, saber que existem coisas onde as regras têm que ser maleáveis, repensadas. Voltamos ao bar indignados e aproveitando que havia uma turma de advogados numa mesa ao lado explicamos o ocorrido e perguntamos o que deveríamos fazer. Primeiro era chamar a pessoa responsável  do bar para que tomasse alguma providência, uma vez que o constragimento e a agressão sofrida foi decorrente de uma falta do estabelicimento e que portanto deveria zelar pelos clientes e, no mínimo, fazer um comunicado ao Quartel. Enquanto conversávamos com os advogados, o militar da guarita chama três colegas que ficam na esquina, algusn instantes, com arma em punho. Lembro bastante de uma figura feminina entre eles. Depois se afastaram.

Chamamos o garçon que chamou a dona do bar. Esta teceu uma série de comentários desastrosos e preconceituosos, incluive perguntando porque voltei ao seu estabelicmento se eu já sabia que não tinha banheiro acessível. Ela já tinha colocado uma rampa na entrada do bar, que eu entrasse no banheiro feminino (que não dá passagem para a cadeira), que ela não poderia ser punida porque não foi ela quem me agrediu, que se eu queria processar porque acho que tenho direitos por ser deficiente, que... que.. que...

O advogado que estava conversando conosco se aproximou para explicá-la sobre a sua responsabilidade, tentando ver uma maneira de apaziguar a situação, mas ela demonstrava total ignorância e não reconhecia o problema provocado por ela, disse que vai abrir um banheiro e que esta era a única coisa que poderia fazer. que não entraria em contato com  o Quartel......

Enfim.... a noite acabou voltando para casa com a auto-estima destruida, com minha amiga arrasada, com todas as questões de desamparo, desalento, medo, ameaça, violência em nossos corpos, nossos peitos. O pior que não há um orgão que nos defenda. Porque lembro do problema que tive com o PROCOM e procurei o Ministério Público que me disse não entrar em briga com o Governo. Não tive um advogado que entrasse comigo na causa... e assim se repete todos os dias, todas as vezes. A Associação Baiana de Deficientes não tem uma assessoria jurídica que compre essas brigas. Então ficamos a mercê de uma briga isolada, individual e passando por chato, brigão, intolerante. O errado sou eu que decido sair e me defrontar com esse mundo perfeito, feliz e generoso.

Para completar, hoje precisei pegar um táxi, liguei para uma empresa e depois de muitos minutos me ligaram dizendo que não havia carro para pegar cadeira de rodas. Lembro que minha cadeira cabe até num fusca, porque desarma toda, tira roda, rodinha, pés.... Ou seja, assim como a dona do bar, uma empresa que deveria zelar pelos clientes, é conivente com os péssimos profissionais que se recusam a prestar o serviço a que se destinam. Um serviço, incluive, que são isentos de determinadas taxas, portanto menos impostos para nós, e prestam deserviço total. Não é a primeira vez que acontece isso e nem é a primeira ou única empresa que faz isso. Já dei queixa na Gtáxi umas três vezes e quando retorno a ligação, eles nem sabem do que estou falando, nem protocolam a queixa. Ficamos sem os direitos garantidos mais uma vez.

E eu tenho taxistas que me pegam, profissioanais ótimos que naquele momento estavam ocupados. Também não acho que eu tenha obrigação de ter uma lista telefônica de serviço particular porque as Elites Chame Ligue Táxi da vida, têm OBRIGAÇÂO de nos atender também.

Cansei.....

Milágrimas

(Itamar Assumpção - Alice Ruiz)

Em caso de dor, ponha gelo
Mude o corte do cabelo
Mude como modelo
Vá ao cinema, dê um sorriso
Ainda que amarelo
Esqueça seu cotovelo
Se amargo for já ter sido
Troque já este vestido
Troque o padrão do tecido
Saia do sério, deixe os critérios
Siga todos os sentidos
Faça fazer sentido
A cada milágrimas sai um milagre
Em caso de tristeza vire a mesa
Coma só a sobremesa
Coma somente a cereja
Jogue para cima, faça cena
Cante as rimas de um poema
Sofra apenas, viva apenas
Sendo só fissura, ou loucura
Quem sabe casando cura
Ninguém sabe o que procura
Faça uma novena, reze um terço
Caia fora do contexto, invente seu endereço
A cada milágrimas sai um milagre
Mas se apesar de banal
Chorar for inevitável
Sinta o gosto do sal
Sinta o gosto do sal
Gota a gota, uma a uma
Duas, três, dez, cem mil lágrimas, sinta o milagre
A cada milágrimas sai um milagre



Porque São Paulo me dá presente quando menos espero. Porque hoje estava precisando desse presente. Porque é amor tudo isso.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Ah, se eu fose Marilyn!

Sou um travesti caquético. Caco de dente na frente. Pêlos na cara. Nenhum amor. Fiz a vida que me coube fazer. Sobrou-me a peruca da Marrilyn. Puta gostosa que partiu com um coreano montado no aqué.
Meu corpo não deu muito pro gasto. Meu pau demorou a subir. Todos sabem que ocó gosta mesmo é de receber na bunda. Fica todo molinho pruma mulher comer seu cu. Eu que só queria dar, me estrepei. Travesti burra morre que nem eu.

Esse corpo de homem peludo: cara, braços, bunda, barriga, pernas... Pernas de cambito que ninguém aguenta ver. Fui ficando torta de vergonha de mim. Agora só me restou a peruca da Marrilyn. Hoje acordei como ontem. Sei que será mais um dia feliz. E que venha doce.
by Hebert Valois

quinta-feira, 16 de junho de 2011

O dia em que meu avô ganhou a Telesena

Sempre lembro muito de meu avô Ismael e minha vó Zinha. Lembro dos sabores da fritada, doce de banana raspando o fundo do prato, doce de leite, oração às 17h no corredor, janela, infância...

Irma, era o jeito que eu o chamava e temos estória ótimas de meu avô. Ele sempre comprava Telesena na esperança de ter seu dinheirinho e comprar os sonhos de final de vida. Num desses dias em que ele conferia o resultado do jogo chegamos do colégio, eu e minha irmã, e meu avô pediu que esta o ajudasse a verificar se tinha sido o grande premiado.

Irma anotava num papel todos os números de 1 a 100 e marcava os números sorteados sublinhando-os. Minha irmã ficou com o papel dos sorteados e meu avô com a cartela da Telesena que parece bingo. Ele, então, dizia os números da cartela e ela conferia se havia saído.

- Veja ai, Popa, número 15.
- Saiu, meu avô!

20 saiu, 33 saiu, 49 saiu..... Meu deus, faltava pouco para meu avô realizar seus sonhos! "Teu carro está garantido, minha filha." Dizia meu avô à minha mãe. Todos nervosos, contentes, fazendo planos. Faltando 3 números para ele completar a cartela inteira, batem na porta. Era o moço que fazia nosso transporte. "Não falem nada a este corno porque ele tem uma língua muito grande". Meu avô já com medo de sequestro. 54 saiu. Faltavam dois números. 71 saiu. Agora era a decisão. Paloma foi atender à porta e retardar a entrada do rapaz para que pudéssemos comemorar tranquilamente com meu avô que pegou o papel que estava com Paloma e foi verificar o derradeiro número.

"Não ganhei, minha filha! Por um número..." Ele foi conferir para ver se não estava errado e verificou os outros.

"Mas o 15 não saiu. o 20 não saiu. nem 49. 33 muito menos". A neta de posse de todos os números possíveis de sorteio não percebeu os sublinhados que eram poucos, e não dariam para o carro, para a vida, não dariam para os sonhos. Meu avô ficou tão decepcionado!

Hoje alimento as mesmas esperanças dele. Toda quarta e sábado me tranformo no mais novo milionário brasileiro na expectativa de ganhar a Megasena. Já tenho todo projeto escrito. Tem dias que jogo querendo ajudar o próximo, mas Deus não quer contrinbuição para creche, nem velhinhos em asilo, nem desabrigados de enchente, então penso egoísticamente e jogo só planejando meu consumo, mesmo assim Deus não disse para que veio.

Não entendo qual é o jogo de Deus. Estou aqui esperando minha irmã me confirmar se ganhei a mega acumulada de sábado, mas até agora nada dela me dizer.

Será que está esperando em voltar? será que está com medo de me decepcionar ou conferiu tudo errado como fez com meu avô?

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Os elepês de Gal de Arthur

Achei curiosíssimo quando vi, no Facebbok, a primeira foto da ação LEVANDOS OS ELEPÊS DE GAL PARA PASSEAR, criada por Arthur Scovino. Depois foram chegando outras e mais outras e as coisas foram tomando outra dimensão para mim, me fazendo refletir em diversas questões. Uma idéia fantástica para falar de coisas importantes de maneira tão simples, como uma campanha publicitária: rápida, simples e certeira. Não precisa explicações, muito palavreado para se entender o que Arthur quer chamar atenção, quer nos fazer pensar. Já diz de cara tudo e precisamos ter atenção a partir daí.

Engraçado como a dinâmica da carreira de Gal Costa mobiliza as pessoas, nos estimula a querer vê-la retomar o lugar que, de certa forma, nunca saiu, mas que não está tão iluminado quanto antes. Em 2003, um paulista conhecido meu, veio a Salvador com o intuito de parar na porta da cantora e pedir pelo interfone, gritando no portão: "GRITA, GAL! GRITA!" Para ele as coisas começaram a mudar para Gal Costa no momento em que ela parou de gritar, começou a cantar comedida, mais técnica, mais sóbria.

Acho essa imagem tão bonita também! Alguém que precisa da voz do outro para se representar. Um desespero de quem quer salvar o outro de um afogamento. Assim como Arthur que leva os elepês para tomar um vento, comprar um côco, pintar ou fazer palestra ou simplesmente ver a vida na janela. Se eu fosse Gal ficaria emocionado com essas coisas, eu daria uns gritinhos de felcidade.

Me refiro a Gal, neste texto, como um símbolo do que nós mesmos somos em um determinado momento, no que deixamos de ser por escolha ou por falta de opção, do que não conseguimos retomar, do que de nós ficou para trás e é impossível voltar e é assim a dinâmica da vida. Nada volta. Mudamos e nos transformamos a cada instante e o que de nós fica no outro é, muitas vezes, uma imagem congelada que não podemos mais corresponder. Não é alegre nem triste. Simplesmente é.

Aqui está o blog do trabalho de Arthur http://elepesdegal.blogspot.com/

Foto Arthur Scovino

sábado, 11 de junho de 2011

Violência contra a mulher com deficiência


Recebi de uma amiga o relatório Violência contra Mulheres com Deficiência e pelo título já sabia que vinha chumbo grosso. Confesso que me incomoda e que tive que ler aos poucos. Esta é uma situação absurda e que precisa ser divulgada, pensada,punida de forma rigorosa. Lógico que estou falando obviedades e por isso transcrevo abaixo algumas partes do Relatório. Procurei na internet algum link que permitisse o acesso pleno ao texto, mas não encontrei. Por acreditar na importência de se conhecer esta realizadade, publico um treco aqui no post e na íntegra numa página especialmente criada para isto.

Violência contra Mulheres com Deficiência

Autoria deste relatório:
The International Network of Women with Disabilities
(“rede internacional de mulheres com deficiência”)

ARQUIVOS ‘BARBARA FAYE WAXMAN FIDUCCIA’
SOBRE MULHERES E MENINAS COM DEFICIÊNCIA
Centro para Estudos de Políticas sobre Mulheres

Março de 2011

Tradução: Romeu Kazumi Sassaki
(...) a violência baseada no gênero inclui uma ampla gama de atos abusivos, tais como mutilação genital, abuso físico e emocional e exploração econômica. De acordo com a Organização Mundial contra a Tortura, o estupro e o abuso sexual, a mutilação genital, o incesto, o aborto forçado, os crimes de honra, a violência relacionada com o dote, os matrimônios forçados, o tráfico humano e a prostituição forçada serão todos considerados formas de tortura [6].  
  
Em complemento, estudos mostram que as pessoas com deficiência são vítimas de abuso em uma escala bem maior que as pessoas sem deficiência [7]. Um fator por trás da crescente incidência de violência contra pessoas com deficiência é o estigma associado com a deficiência. Pessoas com deficiência são, com frequência, consideradas pela sociedade como sendo “não completamente humanas e de menos valor. (...) A ausência de representações de sua indentidade favorece a percepção de que se pode abusar delas sem remorso ou peso na consciência” [8].
Algumas sociedades podem acreditar que a deficiência é um castigo divino ou que a deficiência pode ser contagiosa para outras pessoas. Outras sociedades podem ver a pessoa com deficiência como um objeto de caridade ou pena, e não como uma pessoa que seja digna de direitos iguais aos de pessoas sem deficiência.   
O contexto médico é uma fonte singular de abusos praticados contra pessoas com deficiência [9, 10]. De acordo com o Relator Especial da ONU sobre tortura e outro tratamento ou punição cruel, desumano ou degradante, um dos propósitos da definição de tortura é “por razões baseadas na discriminação de qualquer espécie”, observando que os atos de discriminação ou violência grave contra pessoas com deficiência podem mascarados pelas “boas intenções” dos profissionais médicos.
Tratamentos médicos de natureza intrusiva e irreversível, forçados ou administrados sem o consentimento livre e informado da pessoa em questão, que tenham o objetivo de corrigir ou aliviar uma deficiência ou que não tenham um propósito terapêutico, podem constituir tortura ou tratamento cruel contra pessoas com deficiência [11].
Estes tipos de atos incluem: aborto e esterilização forçados, intervenções psiquiátricas forçadas, internação involuntária em instituições e eletrochoque forçado ou ‘inalterado’ (eletroconvulsoterapia ou ECT) [12].
A privação da capacidade legal para uma pessoa tomar decisões facilita tratamentos coercitivos e violência de todos os tipos e pode constituir tortura e tratamento cruel em si mesmo, pois essa privação pode equivaler à negação da plena qualidade de ser pessoa [13]. Tal forma profunda de discriminação pode causar sofrimento severo.
(...)
De fato, mulheres com deficiência são vítimas de tipos de abuso pelos quais as mulheres sem deficiência não passam [21]. Além disso, a natureza e os tipos de violência contra mulheres com deficiência, e particularmente contra mulheres com deficiência psicossocial e deficiência intelectual, são provavelmente ignorados em estudos sobre violência contra mulheres.
Além dos tipos de violência cometidos contra mulheres em geral, os seguintes atos e atitudes podem constituir violência contra mulheres com deficiência:
a)    isolamento forçado, confinamento e ocultação dento da casa da própria família;
b)    aplicação forçada e coercitiva de drogas psicotrópicas ou colocação de drogas na comida;
c)    institucionalização forçada e coercitiva;
d)    contenção e isolamento em instituições;
e)    criação de situações pretextadas para fazer a mulher parecer violenta ou incompetente a fim de justificar sua institucionalização e privação da capacidade legal;
f)     forjamento de rótulos de raiva e autodeclaração das mulheres como um comportamento de “pessoas com transtorno mental e perigosas” (especialmente se a mulher já foi internada em hospitais psiquiátricos);
g)    negação das necessidades e negligência intencional;
h)   retenção de aparelhos de mobilidade, equipamentos de comunicação ou medicação que a mulher toma voluntariamente;
i)     ameaças para negligenciar ou cancelar apoios ou animais assistentes;
j)      colocação de mulheres em desconforto físico ou em situações constrangedoras por longo período de tempo;
k)    ameaças de abandono cometidas por cuidadores;
l)     violações de privacidade;
m)  estupro e abuso sexual cometidos por membro da equipe ou por outro paciente internado em instituições;
n)   restrição, desnudamento e confinamento solitário que replica o trauma do estupro;
o)    aborto forçado; e
p)    esterilização forçada.

(...)
     Comparadas aos homens com deficiência, as mulheres com deficiência têm, em geral, menos acesso a cuidados médicos qualificados e à reabilitação; recebem medicamentos, ajudas técnicas e outros tratamentos que sejam menos dispendiosos; e têm menos acesso a apoios sociais, educação superior e oportunidades de emprego.

Sugiro a leitura na íntegra, clicando aqui

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Esta vida é uma viagem

Difícil falar alguma coisa quando o silêncio parece te calar. Lembro do snoop desenhado na camisa, com uma frase do Leminski: "Esta vida é uma viagem...
                         Pena eu estar só de passagem"
(5º confissão para Odete - Lucas Valentim)


O melhor é saber que deixamos o túnel para entrar em outro. Como as montanhas da Ilha da Madeira, entrávamos no centro da terra e deixávamos qualquer coisa lá, voltamos para entrar novamente num zig zag redondo que o mundo parece dançar.
E tudo volta como se fosse hoje o amor
(3º confissão para Odete - Edu O.)


Incrível como o gosto se modifica a depender da situação. Digo isso porque o chá de camomila já não tem o mesmo gosto depois de Tê-lo tomado no chão com um amigo.
(7º confissão para Odete - Lucas Valentim)

Fotos de Gabriel Guerra

Odete, traga meus mortos
12/06, as 20h, no Theatro XVIII, R$ 5,00

quinta-feira, 9 de junho de 2011

O não-estar de Diane ou a Falta que ela faz.

Toda hora eu mudava o texto que escrevi para ela. Tirava detalhes desimportantes, colocava outro mais sem importância ainda, enfiava graça, tentava amenizar tristeza.... tudo porque ela está longe e tão perto, mas tão perto que chega a ficar aqui dentro. Sinto saudade do seu peso sobre meu corpo no abraço demorado de amor e do beijo, e do riso, e da atenção, e dos medos, e da insegurança, e do companheirismo eterno. Foi assim desde que nos conhecemos dançando. Depois virou parceira de vida, de grupo, de projetos...

Agora que Odete voltará, fico imaginando como ficará sem suas lágrimas. A maluca chorou todos os dias de apresentação no Vila Velha, e no Encontro e em todas as vezes que falávamos os olhos brilhavam. Sei que agora estarão brilhando lá longe, lá embaixo do continente. Escrevo esta carta como um sussurro, uma confissão ao pé do ouvido, gemido, melado.

O Corpo Perturbador também sentiu sua falta no não colocar as botas, não montar cenário de BIS, no não estar....

Desde que se foi não há muita coisa a dizer porque em tudo ela está. Participou ativamente da montagem de Pequetitas Coisas, viajou comigo a Londres, só não foi ao Piauí porque era coisa rápida. Fiquei de falar sobre a vida, fazer um diário, mas o que dizer dos detalhes constantes do cotidiano? Das pequenas dores, das sutis angústias, das gargalhadas e leves sorrisos? Esse tipo de coisa que não dá para escrever, repetir em palavras digitadas.

Quero que ela seja feliz aonde escolher ficar, mas peço que não demore muito para gastar um tempinho comigo e a gente dançar Arrocha comentando as belezuras do dia-a-dia.

foto de Drica Rocha

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Odete, traga meus mortos


Odete, traga meus mortos
dia 12/06, as 20h, Theatro XVIII (Pelourinho), R$ 5,00

Ritos de passagem
Partir,
Ausência e presença
O lugar do outro em nossas vidas
Nossos mortos (pessoas e situações passadas) marcando nossos corpos, nosso estado... Tudo reverberando em nós até mesmo quando a memória não é ativada.


O caso que levou ao espetáculo:

Num almoço em casa de uma família tradicional, na hora do café, depois de todo ritual da refeição francesa, a matriarca pede a empregada: “Odete traga meus mortos!”. Incrédulo, com expressão assustada, fui informado que este pedido tornou-se habitual daquela senhora que lê diariamente o jornal enquanto toma seu cafezinho. Sua preocupação é saber se algum conhecido faleceu e observar a forma como foi escrito o obituário, sempre discordando e dizendo que não quer o seu daquele jeito. Então começa a descrever como gostaria que divulgassem sua morte, a foto que deve ser colocada, a roupa e como as pessoas devem agir no seu funeral.

Um fato aparentemente triste torna-se o momento mais engraçado do dia da família que passa a lembrar de histórias da vida e de pessoas que passaram por ali. A morte perde a carga de sofrimento, cedendo espaço para lembranças de vidas cheias de experiências, como são todas as vidas. Para aquela senhora, o falecimento do outro possibilita a reflexão sobre sua própria existência.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Depois do mergulho

Da água que se derramou pela casa ao romper a bolsa até o estado de imersão em que me encontro, não consigo encontrar palavras para traduzir o que se passa. Vê-lo nascer, chegar, chorar, comer....
Vê-lo aqui! Meus olhos derramam água e lembro de quando na psicina do clube eu saía do mergulho ofegante, água pingando dos cabelos, olhos... da conquista de atravessar mergulhando de um lado a outro dentro d'água... penso na água que me gerou.

Não precisei
Nadar no últero
De minha mãe
Para chegar
A algum lugar
As águas foram me levando
E eu nasci

sábado, 4 de junho de 2011

Confissão para Odete #11 - a turma mais bonita da cidade

São Paulo me sorri mesmo quando está de cara fechada.

Saí de Santo Amaro há muito tempo. Costumo brincar que minha cidade é uma Metrópole e tudo pode acontecer ali. Aquele chão, realmente, é especial e tem um humor peculiar nas falas de todo mundo que é de lá, figuras incríveis, História e histórias... Por falta de oportunidade de crescimento, os filhos da terra precisam se afastar e mesmo sendo louco por minha Santinho, percebi que quando saimos de um lugar algo em nós deixa de pertencer a aquilo ali e também não pertecemos mais a nenhum outro. Nunca me senti parte de Salvador, por exemplo. Sou um hóspede, um visitante eterno. Não me adapto a muitas coisas dessa capital, não vejo graça em tantas outras, nossa relação sempre foi muito confusa.

Agora em São Paulo aconteceu uma paixão a primeira vista. Foi uma paixão que me trouxe a esta terra e depois o sentimento cresceu tanto que fiquei apaixonado pelo lugar. Eu gosto tanto de São Paulo que aqui eu não tenho necessidade de sair desembestado como turista, não sinto vontade de ficar pelas ruas da cidade aproveitando o tempo da viagem. Como quando eu estou em casa, eu gosto é de aproveitar o tempo dos encontros. Me faz bem somente estar aqui, encontrar os amigos e ganhar as horas falando besteira, rindo, papeando seriedades, recebendo mais gente que chega pro Cafofo... os dias passam como lugar que acolhe, protege e está feliz em você estar ali, nele, com ele.

Nas duas casas que tenho em Sampa (de Cléa e Ed) é como se eu estivesse lá na casinha da Nova Santo Amaro, tocando violão, comendo pipoca com a turma mais bonita da cidade.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Uma história de circo

“Vá dormir que o sono ocupa o estômago!”

De tanto ouvir sua mãe falar, o menino que não tinha o que comer nem com quem brincar, decidiu viver na cama, em cima do colchão carcomido, lençol puído de tempo gasto. Por sorte não tinha problema gastro, apesar da barriga vazia. Sua mãe ocupada nos afazeres diários, sem muita paciência para esta vida que se colocou a sua frente, não prestava atenção naquele menino deitado, quieto, desamparado.
Seu filho não viu as meninas de Zefa crescerem, nem podia saber se gostava de menina ou menino. Não sabia o que eram essas coisas, nem se havia outras coisas senão o sono sem sonho que alimentava seus dias. Vez em quando, de ano em ano, quando o menino fazia aniversário, sua mãe se empenhava em comprar alguma coisa e lhe preparava um café especial com manteiga no pão, leite e o biscoito que toda hora passa na televisão. De novela ela se ocupava. Da vida dos outros também. O menino então se vestia com qualquer roupa diferente das que dormia e sentava na porta da rua sem amigos, sem pipa, sem carrinho. Nem um bolinho para cantar parabéns. Nem um beijo desejando saúde, felicidades, essas coisas. O menino voltava para o quarto ao entardecer e se estendia sem pensar em nada, apenas em dormir para viver.
Foi numa época de calor infernal que uma barulheira na rua fez mudar seu destino. O menino chegou à janela sem vontade e viu a trupe que animava aquela tarde. Palhaço, locutor, caminhão, trapezista, chipanzé, adestrador, bailarinas e até um anão. As pernas deitadas do menino, sem força, saíram atrás do circo como se dançassem sem ritmo, acompanhando o leão. Viu, surpreso, o levantar das lonas, a arrumação do picadeiro, as jaulas, o cansaço, a tristeza dos animais. Havia uma identificação com algo que não conseguia explicar. Encontrou um colchão ao lado dos cavalos esmirrados e voltou a fazer o de sempre. A turma do circo, sem se dar conta da novidade, seguia sua rotinha de ensaios e do que chamavam de cuidados. Como naquela jaula nunca havia nada, nem ninguém, não davam comida ao menino e talvez por isso, o público começou a visitar aquela atração escondida nos fundos da lona, quieta, deitada, magra. Virou a sensação daquela temporada. Sua mãe, vendo o acontecido, aplaudia e dizia em voz alta: “Eu sempre soube que daria para alguma coisa!”

quarta-feira, 1 de junho de 2011

A peruca de Renata Sorrah

Ela saiu numa sexta a tarde para fazer algumas compras: esmalte e batom bem vermelhos, uma camisola verde-água e uma peruca loira. Andou ruas e ruas e ruas de uma cidade vazia, oca de tudo, sem encontrar a tal peruca.

Entrou num salão que exibia na vitrine um manequim loiríssimo de cabelo chanel e franja a la Renata Sorrah ou seria Regina Duarte? Enfim... experimentou a peruca, pechinchou o preço e guardou numa rede a jóia dourada.

- Ficou muito bem na senhora! Elogiou a vendedora.
- Não, minha filha, não é para mim. É para meu filho, ele é a Marilyn Monroe.
Foto dos preparativos da gravação de videodança