Lembro que passei por uma situação constrangedora num tal beco do Rio Vermelho. Um lugar conhecidamente frequentado pelo público gay, portanto sustentado por este pessoal. Não me coloco no meio de quem paga a luz, os funcionários, o gás, a água, enfim, daquele lugar porque tive apenas uma e fatídica experiência.
Estávamos numa mesa com umas seis pessoas e eu todo apaixonadinho pelo namorado de São Paulo que passava férias, já em final de viagem. Era natural querer ficar o mais próximo possível, de mãos dadas. Na leitura do cardápio nos demos um selinho, atitude suficiente para o proprietário do bar largar o que estava fazendo e começar a nos ofender e ser grosseiro e ameaçar nos colocar para fora. Se aquilo se repetisse nós saberíamos o que ele faria. Não preciso falar do mal estar que se instalou ali, na vergonha que senti porque só queria mostrar o melhor e me senti culpado por ele passar por aquela situação, os amigos presentes.... mas eis que começamos a ouvir as outras mesas gritando, batendo palma, solidários a nós "viva o beijo!", "viva o amor, o afeto!", "viva o beijo!!!" e todos começaram a se beijar e esvaziamos o bar imediatamente.
Infelizmente, amigos meus que sabem deste episódio continuaram e continuam frequentando aquele bar que deveria estar fechado e o seu dono falido, punido. Procurei advogados que não souberam, na época (2003), o que fazer. Acho que algumas coisas mudaram, até melhoraram em relação à denúncia, mas muitos morrem pela intolerância, ignorância, violência. É preciso estar atento e forte!
quarta-feira, 16 de maio de 2012
terça-feira, 15 de maio de 2012
Medo de mim
Aquele corpo pequeno, pernas finas, coluna torta, se arrastando pelo meio da casa dava medo na empregada que pediu demissão no dia seguinte ao primeiro de serviço. Era estranho sair da cozinha e ver um pezinho no chão entrar no quarto ou então ao bater na porta da rua não ver quem abriu a porta na minha frente, só depois me dar conta que a pessoa estava embaixo, dizia ela.
Aquele corpo dava medo porque aquela mulher não o conhecia, não tinha hábito de vê-lo desfilar agilidade diária, sorriso, beleza (?). A sua beleza. O medo vem da ignorância, do desconhecimento. De certa forma a mulher deu um poder àquele corpo que ele, no fundo, não tinha. Medo acaba quando o enfrentamos. É difícil enfrentá-lo, alguns nunca conseguem e perdem empregos, perdem tempo, perdem a própria vida.
Aquele corpo dava medo porque aquela mulher não o conhecia, não tinha hábito de vê-lo desfilar agilidade diária, sorriso, beleza (?). A sua beleza. O medo vem da ignorância, do desconhecimento. De certa forma a mulher deu um poder àquele corpo que ele, no fundo, não tinha. Medo acaba quando o enfrentamos. É difícil enfrentá-lo, alguns nunca conseguem e perdem empregos, perdem tempo, perdem a própria vida.
terça-feira, 8 de maio de 2012
Varal de flutuações
Foi a coisa mais simples que vi pelas bandas de lá e talvez por isso, talvez não, com certeza foi o que mais me tocou o afeto. Compartilhei este momento, hoje, com a turma do mestrado. O nome do arquivo estava China e alguns pensaram que eu levaria algo completamente diferente, super-ultra-mega sei lá o que e comecei minha fala dizendo: é apenas um varal, o meu varal de Santo Amaro que encontrei lá. Constantemente vemos na China varais espalhados no alto das casas, na porta da rua. é uma cena linda. Numa cidade enorme, com edifícios tão contemporâneos, tem os sobrados e seus varais. Ali me indicava vida, vendo aquilo dava pra sentir no cheiro de comida de vó, chá, pão quente e manteiga. Nem sei se eles comem isso.
Acho que com todo mundo é assim, comigo é muito forte, não consigo me desgarrar de tudo que me formou, me fez. O varal de meu avô foi meu trabalho de conclusão de curso da Escola de Belas Artes. Eu não tinha moldura para colocar umas colagens que eu fiz e não queria colocá-las naqueles quadrados tradicionais, feios... meu velho morreu nas vésperas da exposição de formatura. No dia do seu sepultamento, quando me despedi de sua casa, lugar que vivi grande parte de minha vida e que a partir de então eu não mais entraria, me deparei com um varal feito de arame duro, torcido, velho e imediatamente peguei para pendurar meus trabalhos que se transformou numa instalação com foto, desenhos, all-star pendurado, luva de figurino, chapéu, papel de bombom, tudo que fazia parte daquele momento que eu vivia e que a faculdade tinha, de certa forma, transformado meu olhar em arte. Pegadas na parede....
Na aula, agora de mestrado, apresentei o video feito em Pequim como imagem correspondente ao momento da minha pesquisa e li um texto, que transcrevo aqui um trecho:
A figura não isolada do entorno.
Repetição de hábitos e a dança flutuante a mercê dos ventos. O fundo enraizado
sustenta as folhas, diversidade com possibilidade de queda que também pode ser
mudança, renovação. Necessárias mudanças para o fluxo do processo. Há corpos
nas roupas penduradas que bailam nas ruas. Corpos invisíveis que se fazem ver
porque há vida-história em tudo ali. Carreguei para o outro lado do mundo todas
as minhas vivências e trouxe de lá bagagem pesada das experiências novas.
Organização de idéias... ou seria desorganização das idéias¿ Fagulhas de
porvires desconhecidos, mas pressentidos. Novamente necessárias mudanças,
angústias, desespero. E aquela tranqüilidade registrada em vídeo não se fará
presente¿ Rua pacata, árvores que são apenas o que são e isso não é pouco. Ser
o que é, não representação do que se pretende ser. Vestígios de afazeres
cotidianos, utilidades.
Agora estou silenciando para não
vazar desnecessidades. E no final há uma placa de cuidado ao atravessar.
*Flutuação na Teoria Geral de Sistemas significa CRISE
domingo, 6 de maio de 2012
Diga-me quem és que eu te direi com quem andas
Sou aquele torto com pensamento fora do tempo, tentando ficar lúcido nesse tempo de agora, com picos de loucura.
Sem medir valor e sem saber se está além ou em tempos idos, sou aquele das coisas simples, importantes, dando a volta ao mundo sem vê-lo girar.
Sou o que fala alto, gargalha, chora e silencia.
Sou esse que não sabe porque dizer essas coisas, mas diz.
Sem medir valor e sem saber se está além ou em tempos idos, sou aquele das coisas simples, importantes, dando a volta ao mundo sem vê-lo girar.
Sou o que fala alto, gargalha, chora e silencia.
Sou esse que não sabe porque dizer essas coisas, mas diz.
sábado, 5 de maio de 2012
Quando fiquei pequeno em Pequim
Estar do outro lado do mundo, para mim, foi mais impactante por pensar geograficamente. Andando numa rua da China encontrei um globo terrestre e precisei, como criança, comprovar o que é óbvio, mas não cai a ficha quando estamos vivendo. Coloquei um dedo no Brasil e percorri o trajeto que fiz até chegar lá. Posição oposta naquele mundo de mentira. Eu estava de verdade naquele ponto distante.
Confesso que não me senti em outro universo, mundos distintos, outro planeta. Não. O Oriente se ocidentalizou, a publicidade faz seu massacre em todo canto. Mesmo assim foi incrível! Foi como num sonho e eu ainda não acordei.
Em muitos momentos me senti um CORPOESTRANHO, CORPOPERTURBADOR. Eles tiravam fotos, me olhavam curiosos e meio escabreados, tímidos. Não somente pela cadeira de rodas, mas também por ser ocidental. Com outros dançarinos do Candoco, companhia de dança que me levou para lá, eles paravam na rua para perguntarem coisas, tirarem fotos... situação curiosa e engraçada.
Comi escorpião, enguia, água viva. Vi lugares inacreditáveis, coisas incríves. Palácios, templos, varais dançando nas ruas e sinos cantando baixo e constante. barcos flutuando como se fosse em nuvens. E eu pequeno diante de tudo aquilo, sentia o quanto crescia aqui dentro.
sexta-feira, 4 de maio de 2012
Deficiência em Cena
Carolina Teixeira foi a preparadora corporal d'O Corpo Perturbador, minha amiga querida e uma referência no meu trabalho, realizará nesta próxima quarta-feira (09-05), aqui em Salvador, o lançamento de seu livro Deficiência em Cena, no Ciranda Café, Cultura e Artes - Rua Fonte do Boi, Rio Vermelho, a partir das 19h.
"O trabalho tem como meta expor uma investigação acerca do corpo deficiente na cena artística brasileira com base na experiência construída junto a Roda Viva Cia. de Dança. O trabalho busca a reflexão sobre a questão destes corpos até então considerados incapazes para tal prática e que inauguram na cena artística um despertar para novas possibilidades estéticas de movimento, criação e produção artística". - Carolina Teixeira
"O trabalho tem como meta expor uma investigação acerca do corpo deficiente na cena artística brasileira com base na experiência construída junto a Roda Viva Cia. de Dança. O trabalho busca a reflexão sobre a questão destes corpos até então considerados incapazes para tal prática e que inauguram na cena artística um despertar para novas possibilidades estéticas de movimento, criação e produção artística". - Carolina Teixeira
segunda-feira, 9 de abril de 2012
Chimamanda Adichie: O perigo de uma única história
Esta é uma palestra da contadora de história nigeriana, Chimamanda Adichie, sobre o que chama de "O perigo de uma única história", de onde surgem os preconceitos, os estereótipos. Discorre sobre a imagem que se faz dos africanos e começa de como as histórias infantis eurepoéias e americanas influenciaram a forma dela ver seus pares e a ela própria no mundo, na literatura. Sem as referências africanas, sem suas matrizes. Depois enumera uma série de equívocos de uma colega de quarto quando se mudou para os EUA para estudar na Universidade, outro professor que não via a "identidade africana" em seu romance, entre outros exemplos bastante contndentes. Afirma a importância de olharmos de forma ampla sobre alguma coisa, não acomodarmos com uma única história, da necessidade de exemplos afirmativos, positivos e não somente negativos sobre algo, alguém, uma nação, enfim... que isso constrói novos parâmetros, aproximações. É emocionante e urgente se apropriar desse pensamento.
Podemos ampliar a discussão para outros campos que não sejam apenas étnicos: deficientes, gays, mulheres etc etc
Aqui, transcrevo uma parte de sua fala para vocês entenderem melhor do que se trata. Após falar sobre os problemas da Nigéria:
"Todas essas histórias fazem-me quem eu sou, mas insistir somente nessas histórias negativas é superficializar minha experiência e negligenciar as muitas outras histórias que formaram-me. A única história cria estereótipos. E o problema com estereótipos, não é que eles sejam mentira, mas que eles sejam incompletos. Eles fazem uma história tornar-se uma única história".
Assistam também a parte 2 do video. São apenas 9min de cada. Garanto que vale a pena.
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