sexta-feira, 30 de julho de 2010

As contradições do corpo

Foto de André Baliú

Meu corpo não é meu corpo,
é ilusão de outro ser.
Sabe a arte de esconder-me
e é de tal modo sagaz
que a mim de mim ele oculta.

Meu corpo, não meu agente,
meu envelope selado,
meu revólver de assustar,
tornou-se meu carcereiro,
me sabe mais que me sei.

Meu corpo apaga a lembrança
que eu tinha de minha mente.
Inocula-me seu patos,
me ataca, fere e condena
por crimes não cometidos.

O seu ardil mais diabólico
está em fazer-me doente.
Joga-me o peso dos males
que ele tece a cada instante
e me passa em revulsão.

Meu corpo inventou a dor
a fim de torná-la interna,
integrante do meu Id,
ofuscadora da luz
que aí tentava espalhar-se.

Outras vezes se diverte
sem que eu saiba ou que deseje,
e nesse prazer maligno,
que suas celulas impregna,
do meu mutismo escarnece.

Meu corpo ordena que eu saia
em busca do que não quero,
e me nega, ao se afirmar
como senhor do meu Eu
convertidoem cão servil.

Meu prazer mais refinado,
não sou eu quem vai senti-lo.
É ele, por mim, rapace,
e dá mastigados restos
à minha fome absoluta.

Se tento dele afastar-me,
por abstração ignorá-lo,
volta a mim, com todo o peso
de sua carne poluída,
seu tédio, seu desconforto.

Quero romper com meu corpo,
quero enfrentá-lo, acusá-lo,
por abolir minha essência,
mas ele sequer me escuta
e vai pelo rumo oposto.

Já premido por seu pulso
de inquebrantável rigor,
não sou mais quem dantes era:
com volúpia dirigida,
saio a bailar com meu corpo.

(Carlos Drummond de Andrade)

Em 2009 participei de um workshop de Elisa Lucinda onde ela dava aulas de poesia falada, bem ao seu estilo, num trabalho maravilhoso de uma mestra com total conhecimento da palavra, do português, da poesia. Ter contato com Elisa é um privilégio. Ter contanto com a obra de Drummond então...
Ele é meu poeta preferido e esta poesia escolhi para abrir o espetáculo O Corpo Perturbador. Na ocasião do workshop foi emocionante descobrir esse texto, suas entranhas, suas nuances. Recebi um elogio de Elisa que me deixou nas nuvens. Ela dizia que este poema falado por mim tomava um significado e uma dimensão que nem o próprio Drummond imaginaria. Imagine ai?

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Casa de Massagem - Herculano Neto (MICROCONTO DEVOTEE)

Como anunciado há uma semana, vamos realizar neste mês de Agosto um concurso de MICROCONTOS DEVOTEES. Na verdade, se trata de uma brincadeira onde pretendo estimular a todos pensarem em situações em que o tema esteja inserido. Não haverá julgamento, nem o melhor, nem o pior. Para mim é importante pois as situações criadas por vocês podem me estimular na coreografia, a pensar em cenas, ao mesmo tempo em que fortalece a participações dos visitantes no blog.

Eu admiro muito os textos de Herculano Neto, meu conterrâneo, e pedi que ele participasse da brincadeira, então recebi um email dizendo:

Edu,

Segue duas visões do mesmo microconto,
baseado nas observações que faço do centro da cidade
(onde moro).
Abs,

Hneto

Microconto Devotee

CASA DE MASSAGEM

Herculano Neto

Sou atendente de uma casa de massagem no Centro de Salvador há seis meses. Minha família acredita que trabalho como doméstica numa casa de família, mas na verdade ofereço serviços sexuais rápidos e baratos. Tudo é muito simples: os clientes tocam a campainha, encontram dez garotas trajando lingerie, escolhem a que desejam, depois pagam e vão embora, como se tivessem acabado de sair de uma lanchonete.

Hoje, observando pelo olho mágico, tive a impressão de que havia um homem com um bebê. Quando abri a porta, descobri que ele carregava o irmão de dezenove anos, que não possuía nem braços ou pernas. O homem disse que era aniversário do irmão e queriam comemorar. As meninas, assustadas, baixaram a cabeça com receio de serem contempladas; eu não – talvez por isso ele tenha me escolhido.

Dentro do quarto, tentei puxar conversa, descontrair o ambiente, mas ele não dizia nada. Então, tirei sua roupa cuidadosamente, segurei seu torso como se fosse uma boneca (ele era mais pesado do que aparentava) e o coloquei numa posição que eu imaginava ser a mais apropriada para o ato. Foi a primeira vez que gozei no trabalho.


CASA DE MASSAGEM II

Herculano Neto

Cheguei ao mundo sem os braços e as pernas. Se existe vidas passadas, e lei de causa e efeito, como dizia minha vó, fico imaginando que merda fiz em outra encarnação.

Todos os dias, meu irmão me deixa na Estação da Lapa pela manhã e me apanha depois do meio-dia. As pessoas que passam por mim, numa mórbida curiosidade, costumam deixar algum trocado, mas nunca peço nada. Muitas têm medo de mim, desviam o caminho, olham com asco, aceleram o passo: e isso me chateia. Sou um cara conformado, sem grandes aspirações na vida, apenas gostaria que me enxergassem naturalmente.

Hoje é meu aniversário. Meu irmão prometeu que comemoraríamos com estilo. Ele disse que seria uma surpresa, mas me levou a uma casa de massagem — já desconfiava. Quando entramos, as garotas me olharam do mesmo jeito de sempre, escolhi a que parecia ter menos medo de mim. Dentro do quarto ela me tratou com muito cuidado, como se eu pudesse quebrar a qualquer momento, o que me deixou ainda mais chateado. Ela me colocou numa posição que não tinha como dar errado, então a fodi com fúria, com toda a força do meu coração, lembrando de cada olhar de desprezo das ruas, enquanto um sorriso de contentamento ganhava sua face.


Herculano Neto nasceu em Santo Amaro da Purificação (BA). É poeta, ficcionista e letrista de música popular. Participa das antologias Os Outros Poemas de Que Falei (Prêmio Banco Capital de Literatura, 2004) e Sob Prescrição (Laetitia Editore, 2006). Em 2007 recontou o clássico disco Transa, de Caetano Veloso, pelo site paulista MOJOBOOKS e publicou alguns poemas nacionalmente na Revista Cult. Teve a canção FAZ DE CONTA, tema da novela Como Uma Onda, da Rede Globo, gravada por Raimundo Fagner em 2004. É um dos vencedores do Prêmio Braskem de Cultura e Arte, 2008, com o livro de poemas, CINEMA, publicado pela Fundação Casa de Jorge Amado. Edita o blog POR QUE VOCÊ FAZ POEMA??? http://herculanoneto.blogspot.com

Esta biografia eu encontrei no http://www.revista.agulha.nom.br/herculanoneto.html

Só reforçando o entendimento sobre os devotees : "Homens e mulheres de todas as tendências sexuais, de todas as idades, niveis intelectuais, socio econômicos, ou condições físicas, que tem atração por deficientes físicos, sendo muitas vezes essa atração de cunho sexual" Kronos

terça-feira, 27 de julho de 2010

Os Bichos de Lygia no meu Corpo

Desde o primeiro momento em que pensei neste projeto tive vontade de pesquisar a obra de Lygia Clark, especialmente a série Bichos pela dessacralização da obra de arte e pelos seus movimentos que desejei trazer para o meu corpo. Lendo mais sobre este trabalho percebi que era perfeito como fonte de pesquisa para o que pretendia por tudo que ele significa e pelo discurso que pretendo trazer com o Corpo Perturbador. Abaixo dois textos que selecionei na época em que nem havia pensado no edital, mas já me contaminava com Lygia. Tanto que em 28/05/2008 escrevi um email para Wagner Schwartz falando sobre os Bichos, trabalho que eu não sabia ele havia pesquisado também:

Wagner, meu deli, só hoje tive a 'brilhante idéia' de pesquisar no google para ver se vc tinha site. eita burrice!!!! estive passeando por ele e vi a referência aos bichos de Lygia Clark. Não sei o que é isso, mas quando pensei nesse trabalho dela, na verdade eu nem conhecia direito. Fiz Artes Plásticas, mas na época me interessava por outras coisas e nunca fui um estudioso de Lygia. Pensei na cena que queria e me veio a imagem dos Bichos. Pesquisei e descobri que penso arte muito semelhante ao que ela dizia, sentia... Fiz, inclusive, especialização em Arteterapia. Penso em você para me ajudar na idéia da cena do Bicho e você já tem algo refrente a isso. As coisas vão se agrupando, né? Acho ótimo!!!


Abaixo dois textos que selecionei naquela época.

Lygia Clark em 1960, ela criou obras que podiam ser alteradas pelo espectador. Eram chapas de metal articuladas por dobradiças, que a artista chamou de Bichos e que assumiam formas diferentes após a manipulação para a qual os espectadores eram agora (ao invés de proibidos) convidados. Essas obras são revolucionárias, pois foi a primeira vez que o público podia modificar uma obra de arte, quebrando com os conceitos de aura, sacralidade e autoria única, solidificados desde o Renascimento

1978 - O fio condutor desse fase da sua obra é a relação entre corpo humano e arte. Seus “objetos relacionais” são uma série de manipulações artísticas que ancoram sua obra no universo de uma arte construída a partir do espectador/paciente. O processo terapêutico se irradia nas duas direções: na cura do sujeito/paciente que participa do processo da obra e na emancipação da obra de arte do seu status de objeto/produto. Segundo ela própria, quando o objeto perde sua especificidade como mercadoria/produto/obra e adquire significado na sua relação com a estrutura psicológica do sujeito, então a arte acontece e a possibilidade de cura aparece.

Ana Maria Caetano de Faria

http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/lygia-clark/lygia-clark-2.php



O texto abaixo foi escrito por Aléxia Bretas em seu blog Dimensão Estética

Contra a concepção marxista da arte como pura ideologia, Marcuse, em um de seus últimos ensaios, escreveria: "Toda a verdadeira obra de arte seria revolucionária, na medida em que subverta as formas dominantes da percepção e da compreensão, apresente uma acusação à realidade existente e deixe aparecer a imagem da libertação" (Marcuse, 2000, p. 13). Sem injustiça, de tal natureza é a prática artística de Lygia Clark. Intuitivamente solidária à premissa que admite o viés entre a arte e a política, seu trabalho investe no potencial emancipatório de uma dimensão estética transformada. Daí, já em 1968, ela afirmar: “Se eu fosse mais jovem, faria política” (Clark, 2006).

Clark – que teve uma iniciação relativamente tardia nas artes, aos 27 anos de idade – assina, com Ferreira Gullar e outros seis artistas, o Manifesto Neoconcreto, de 1959. Logo de saída, a expressão “neoconcreto” é apresentada como uma “tomada de posição” frente à arte “não-figurativa”, e particularmente à arte concreta, comprometida por uma “perigosa exacerbação racionalista” (Gullar in Clark, 2006). Dispostos a corrigirem os equívocos produzidos por uma noção mecanicista de construção, derivada de uma atitude cientificista, de extração gestáltica, os neoconcretos defendem o primado da obra sobre a teoria, reivindicando o privilégio da sensibilidade sobre a razão. E garantem: “Ou bem a profecia de uma total integração da arte na vida parece-nos possível (...), ou essa integração nos parece cada vez mais remota e a sua obra se nos mostra frustrada” (Gullar in Clark, 2006). Ao retomarem o projeto de dissolução da arte na vida propalado pelas primeiras vanguardas, figuras como Amílcar de Castro, Ferreira Gullar, Franz Weissmann, Lygia Clark, Lygia Pape, Reynaldo Jardim e Theon Spanúdis repõem o problema estético em nova chave, subvertendo as categorias de espaço, tempo, forma, estrutura e cor, em nome de uma experiência artística totalmente re-significada.

Que se recorde que de 1954 a 1956, Clark já havia realizado outras quatro exposições com o Grupo Frente – do qual faziam parte também Lygia Pape e Hélio Oiticica. Durante estes anos de pesquisa “geométrica” – em grande medida, inspirada em Mondrian –, os limites da representação pictórica são radicalmente esgarçados, pela tentativa, sempre renovada, de enfrentar a “crise do retângulo” com a superação da própria bidimensionalidade do quadro. No caso de Lygia Clark, as Superfícies Moduladas (1956-1958) correspondem à solução encontrada para o aparente esgotamento do plano e, vistas em retrospecto, representam seu primeiro passo para fora das fronteiras do objeto como tradicionalmente concebido.

Tanto que o estudo clarkiano da linha orgânica resulta na criação dos Casulos (1959) e, mais tarde, de suas célebres chapas de metal articuladas por dobradiças, a propósito, batizadas de Bichos (1960). A própria artista explica que tais “contra-relevos” ou “neo-objetos” são como um organismo vivo, “uma obra essencialmente ativa”. Ela continua: “Uma integração total, existencial, é estabelecida entre ele e nós. (...) Na realidade, trata-se de um diálogo em que o Bicho reagiu às estimulações do participante. [Portanto], esta relação entre obra e espectador – antigamente virtual – torna-se efetiva” (Clark, 2006). Ao colocar em xeque os protocolos da contemplação passiva, Lygia é pioneira em promover a participação do público como condição de possibilidade do próprio “acontecimento” artístico."

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Dona Alda - entrevista O Corpo Perturbador



A entrevistada de hoje é Dona Alda, minha avó paterna, falando sobre a vida de forma bastante humorada. Diversão garantida e boas reflexões também. Um corpo envelhecido aprisionando os desejos, a vontade de sair, de estar no mundo.

sábado, 24 de julho de 2010

Vênus de Milo

Olha lamento dizer mas está trabalhando sobre reflexões erradas e defasadas. Existe material bem mais aprimorado e sem conteúdo preconceituoso.


O que são devotees?

HOMENS E MULHERES DE TODAS AS TENDÊNCIAS SEXUAIS, DE TODAS AS IDADES, NÍVEIS INTELECTUAIS, SOCIO ECONÔMICOS, OU CONDIÇÕES FÍSICAS, QUE TEM ATRAÇÃO POR DEFICIENTES FÍSICOS, SENDO MUITAS VEZES ESSA ATRAÇÃO DE CUNHO SEXUAL.

Não existe essa de só nos atrairmos pele deficiência, ao contrário da sociedade em geral não a vemos como algo negativo, mas como um tempero a mais que as mulheres tem na sedução.

Nem todo devoto vai se atrair por um mulher apenas por ela ser defi, embora isso possa contar muito.

Se preferimos loiras, morenas, negras, gordas, magras, pequenas, grandes, tudo isso é visto como normal, mas se preferimos as defis então temos problemas? Quem decretou que a deficiência deva ser sempre algo negativo?

Tenho em minha sala uma estátua da Vênus de Milo, aquela sem os braços. Minha empregada perguntou se poderia jogar aquela estatua quebrada fora, lhe disse que era assim mesmo, uma obra de arte, mas ela só quietou quando falei quanto valia. Para os devotos a deficiência pode ser uma obra de arte, mas nem por isso todos nós ficamos como cachorrinhos no cio ao ver uma defi. Não somos doentes nem fetichistas, mas temos como todos uma atração, só que a nossa é diferente, especial.

=kronos

* Kronos escreveu este depoimento no post publicado sobre os devotees, pretenders e wannabes. Achei importante publicar porque nos ajuda na compreensão do tema ainda mais se tratando da fala do próprio devotee. Isso enriquece nossa pesquisa e ajuda a ampliar os olhares.

Obrigado!

Vênus de Milo

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Arthur e as miséra

O início de toda pesquisa, todo processo, dá uma sensação de perdido, de por onde ir, ainda mais quando se tem muitas idéias, possibilidades, desejos. A partida foi dada e agora é o tempo contra tudo, contra minha ansiedade sobretudo. Quero ver as coisas tomando corpo, meu corpo, mas também não depende só de mim e eu não me acalmo.


Aqui em Salvador está um tempo ruim, não dá para ver as "miséra" que Arthur aconselha. Só me resta esperar o bom tempo chegar.





Hoje foi um dia muito exaustivo, estou precisando de leveza, de pensar em coisas belas, Arthur Scovino fala de uma perturbação super positiva e por isso foi o escolhido para a entrevista de hoje. Ele é todo delícia: no sotaque carioca, no sorriso sempre pronto, no jeito de ser natural.

Que todo dia seja doce como Arthur!

roubei a foto no orkut dele, será q vou tomar dura?

terça-feira, 20 de julho de 2010

ÍTACA e Pasárgada

Ítaca

Se partires um dia rumo à Ítaca
Faz votos de que o caminho seja longo
repleto de aventuras, repleto de saber.
Nem lestrigões, nem ciclopes,
nem o colérico Posidon te intimidem!
Eles no teu caminho jamais encontrarás
Se altivo for teu pensamento
Se sutil emoção o teu corpo e o teu espírito. tocar
Nem lestrigões, nem ciclopes
Nem o bravio Posidon hás de ver
Se tu mesmo não os levares dentro da alma
Se tua alma não os puser dentro de ti.
Faz votos de que o caminho seja longo.
Numerosas serão as manhãs de verão
Nas quais com que prazer, com que alegria
Tu hás de entrar pela primeira vez um porto
Para correr as lojas dos fenícios
e belas mercancias adquirir.
Madrepérolas, corais, âmbares, ébanos
E perfumes sensuais de toda espécie
Quanto houver de aromas deleitosos.
A muitas cidades do Egito peregrinas
Para aprender, para aprender dos doutos.
Tem todo o tempo ítaca na mente.
Estás predestinado a ali chegar.
Mas, não apresses a viagem nunca.
Melhor muitos anos levares de jornada
E fundeares na ilha velho enfim.
Rico de quanto ganhaste no caminho
Sem esperar riquezas que Ítaca te desse.
Uma bela viagem deu-te Ítaca.
Sem ela não te ponhas a caminho.
Mais do que isso não lhe cumpre dar-te.
Ítaca não te iludiu
Se a achas pobre.
Tu te tornaste sábio, um homem de experiência.
E, agora, sabes o que significam Ítacas.

Constantino Kabvafis (1863-1933)
in: O Quarteto de Alexandria - trad. José Paulo Paz.
Fonte: http://www.bancodeescola.com/itaca.htm
 
 
 
 
Vou-me Embora pra Pasárgada


Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive

E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.


Manuel Bandeira (1886-1968)
Texto extraído do livro "Bandeira a Vida Inteira", Editora Alumbramento – Rio de Janeiro, 1986, pág. 90
Fonte: http://www.releituras.com/mbandeira_pasargada.asp

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Alex e Drummond - a poesia



Encontrei Alex vendendo poesia falada na Praça Roosevelt em São Paulo. Seu olhar e suas palavras me emocionaram muito e pedi que ele me concedesse esta entrevista para o Corpo.

Hoje é segunda-feira, dia de entrevista e poesia aqui no blog. Drummond de presente para mim.

Os ombros suportam o mundo
Carlos Drummond de Andrade


Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.

Microconto devotee

- Vou te contar um segredo.
- Qual?
- Eu transei com um homem de uma perna só.
- E aí, foi legal?
- Ele ficou numa posição ótima e me fez de moleta.

Este microconto foi escrito e publicado por Cleyton Cabral do blog http://cleytudo.blogspot.com/ inspirado pela pesquisa aqui do Corpo. Estou adorando tudo isso.

Pensei que podemos lançar no mês de Agosto um concurso de microcontos para ilustrar durante o mês de Setembro nosso blog. Comecem a pegar caneta e papel e colocar a criatividade para funcionar. A divulgação do prêmio será feita no final de Julho (preciso ver a produtora, ne? rs). Cleyton, inclusive, será um dos avaliadores dos contos. Estou contactando com outros possíveis jurados.

Mas já está lançada a campanha: Concurso de Microcontos Devotee. Comecem a escrever.

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Entrevista Cléa Ferreira



Cléa é peça fundamental no quebra-cabeça que sou eu. Companheira de todas horas, foi extraordinária na colaboração da feitura desse projeto, junto com Fafá Daltro. Contribui com sua inteligência, sensibilidade e habilidad em escrever. Traduzia minhas idéias, ajudava a me acalmar. Estava nessa época em Angola, agora em São Paulo e embora distante me parece tão próxima, tão dentro, tão presente.

A história dela daria um livro, um filme, um espetáculo. Ela é um espetáculo na vida de qualquer um. té inventou de virar atriz de video-clipe. Quem aguenta essa pedagoga santamarense?

Sua inteligência e sua "mania" em ser amiga talvez sejam as maiores características. Hoje deu saudade e a trouxe pro blog para agradecer-lhe por tudo e por isso aqui também que talvez não existisse sem a sua colaboração.

Eu poderia contar várias estórias que passamos juntos, mas quero calar e ouvi-la.

Saudade perturba!

Abaixo, o clipe que Cléa protagonizou da música Alto do Coqueirinho, da cantora/amiga Marcela Bellas.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Sobrevivente do Nazismo dança "I will survive" no campo de concentração



Uma família tem causado polêmica no YouTube. No vídeo, grupo de descendência judia dança a música 'I will survive' nos campos de concentração em Auschwitz. A música ficou eternizada na voz de Gloria Gaynor.


Adolek Kohn, de 89 anos, foi sobrevivente do Holocausto e decidiu, junto com seus familiares, gravar o vídeo nos campos de concentração, no sul da Polônia.

Kohn disse que essa foi a maneira que ele encontrou de comemorar a sua sobrevivência e compartilhar sua história com seus parentes.

Adolek Kohn disse que não fez o video com a intenção de ofender as vítimas do nazismo.

Fonte: http://jbonline.terra.com.br/

Umas loucurinhas

Estava conversando com uma miga sobre o projeto e comecei a falar de coisas que já aconteceram. Lembrei de como pedi a entrevista a Baby do Brasil, de mensagens que já recebi, de comentários que ouvi. Já começou bem, viu? Posso garantir!

1) Fui assistir ao show de Baby com Elza Soares e Ademilde Fonseca no SESC Vila MAriana/SP, acompanhado de Ed Andrade e Marja. Fui munido com minha máquina fotográfica porque já planejava o bote na coitada. Assistimos aquela maravilha das três divas, choramos, gritamos, cantamos... eu estava em êxtase ao lado do não menos emocionado Ed. Estávamos chegando a um certo nível de loucura quando o espetáculo terminou. Saimos correndo para o foyer onde elas atenderiam o público. A primeira a sair foi Elza, depois Ademilde e nada de Baby. Elza estava com um problema no fêmur e aproveitou minha cadeira de rodas para se apoiar emquanto falava com outras pessoas. Um cidadão começou a brigar comigo proque eu não saía de junto dela, eu já nervoso com toda a situação e com a espera de Baby, soltei uma dura para a criatura que na certa queria que eu derrubasse a pessoa que se segurava em mim. Minha mente só pensava na porta se abrindo, o povo atacando Baby e eu sem conseguir chegar perto dela. Consegui um outro apoio para Elza e saí direto para a porta onde as cantoras saíam.

Me organizei com os meninos para não parecer tiete chato pegando no pé do ídolo, Marja seria a produtora e Ed o cinegrafista. A organização não serviu para nada, porque quando a porta se abriu e eu vi Baby se aproximando, joguei meu corpo para a frente, coloquei minhas mãos sobre os pés dela e joguei a bom:

"Baby, fui pro carnaval para ouvir tuas palavras de fé e agora estou aqui para saber qualé que é" Que mico!

Ela deve ter pensado que eu era um louco, sem noção e de imediato me concedeu a entrevista. Fui ao céu!

A outra loucurinha foi uma mensagem que recebi de um amigo quando leu o post sobre os devotees e me confessou: "Oi Du, muito interessante o assunto! Fiquei até de pau duro hehehe. Abração!". Pode ter coisa melhor?

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Entrevista Débora Pedroso


Quando eu passei no vestibular para Artes Plásticas um amigo de minha mãe me perguntou se isso dava dinheiro, em outras palavras ele queria perguntar se eu teria sucesso. Respondi que isso dependeria do meu trabalho e de quanto eu me dedicasse a ele.

Sucesso é uma palavra de conceito bastante subjetivo, né? Para mim, sucesso é quando algum projeto alcança o objetivo esperado, quando nossas expectativas são satisfeitasou superadas, mas sei que grande parte das pessoas pensam o sucesso como uma exposição na mídia ou algo semelhante. É, pode ser.

Pensando especificamente neste projeto, O Corpo Perturbador, sinceramente eu já o considero um sucesso porque é difícil um trabalho que não estreou ainda, que está no início de seu processo despertar tanto interesse e estimular outras pessoas a produzirem, colaborarem, participarem. Este é um dos principais objetivos do Corpo. Já estou alcançando. Em menos de uma semana de atividade do blog já conseguimos mobilizar as pessoas, com participação aqui nos comentários, com emails, publicações em seus blogs pessoais, com vídeos que fizeram especialmente para O Corpo Perturbador.

Débora Pedroso é uma dessas colaboradoras/incentivadoras do projeto, publicando desde o primeiro dia em seu site http://debpedroso.wordpress.com/ coisas referentes ao projeto e agora nos presenteando com essa delícia de depoimento que gravou lá em Miami e me enviou tão carinhosamente.

Conheci Débora em 2002, Belo Horizonte, quando participamos de um festival do Very Special Art. Ela participava como produtora de um grupo do Rio e eu apresentando a performance Marcas, com o Rodart, ocasião em que dividimos a noite com o Candoco. Ficamos em quartos vizinhos e os chumbados do Rio eram muito animados. Foi nessa época que conheci essa expressão que se refere aos def's e adorei. Até hoje uso chumbado para se referir a mim e a outros. Acho engraçado, leve, quebra a chatice dos termos politicamente corretos. Os cariocas tocavam violão, faziam a maior festa e eu junto, criei logo amizade e me identifiquei com a simpatia deles. Foram dias maravilhosos! Ela era fã de Jorge Vercilo. Ainda é?

Depois nos encontramos na net e de certa forma mantivemos contato. Hoje ela está presente de forma deliciosa na minha vida, meu trabalho, colaborando lá de longe, mas tão pertinho.

Débora, obrigado, obrigado, obrigado! Adorei a surpresa de teu vídeo. Beijão

Aos visitantes, fiquem a vontade para me mandar o material que desejarem, a colaboração que acreditarem úteis para o projeto.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Devotees, Pretenders e Wannabes

Foto de Alessandra Nohvais


Há uns três anos fui convidado a dançar num seminário sobre sexualidade na mesma noite em que um pesquisador falaria sobre a sexualidade e o corpo com deficiência. Nesta ocasião tive conhecimento da existência de pessoas que se sentiam atraídas sexualmente por pessoas com deficiência, sendo o objeto de desejo especificamente a deficiência. Isso me despertou a curiosidade sobre o tema e o desejo de desenvolver um projeto artístico onde eu pudesse falar além da sexualidade, das relações sociais, religiosas, políticas e afetivas incidindo em nossos corpos e fui em busca de informações na internet.


Encontrei no site Bengala Legal uma palestra que explicava algumas nomenclaturas que diferenciavam a forma de interesse pela deficiência "Existem os devotees que são pessoas (homens ou mulheres, hetero ou homossexuais) que se sentem sexualmente atraídas por pessoas com deficiência. Há também os pretenders que são pessoas que, além de serem devotees, sentem-se sexualmente estimuladas quando fingem ser deficientes, utilizando, em público ou privadamente, equipamentos como cadeira de rodas, muletas, bengalas, aparelhos ortopédicos. Além disso, existem os wannabes, que são devotees que desejam tornar-se, de fato, deficientes".


A palestra "Devotees, Pretenders e Wannabes: atração por pessoas com deficiência - preconceitos e mitos" escrita por Lia Crespo, foi realizada no Rio de Janeiro em agosto de 2000 na X Conferência Mundial da Rehabilitation International.


O período desse texto nos aponta que o tema já desperta interesse há mais de dez anos, embora permaneça até os dias atuais reservado a guetos e grupos específicos, sendo desconhecido pela maioria das pessoas. Para mim isso tudo foi muito interessante, me dedicando a pesquisa, tendo muita dificuldade em encontrar material que ampliasse meu conhecimento no assunto.


Infelizmente não sei (ainda) ler Inglês e a maioria do que encontro sobre o tema esto nesta língua. Então, tive que buscar alternativas. Encontrei salas de bate-papo específicas para def's e era lógico que ali seria o lugar propício onde eu teria acesso mais rápido aos devotees. Dentre milhares de detalhes e características que descobri sobre eles, para mim despertou interesse o fato de que raramente realizam a fantasia em termos reais, preferem ficar no nível da imaginação e da virtualidade. Os devotees raramente assumem sua identidade real, escolhendo perfis fakes em comunidades e blogs especializados no assunto. Foi por causa dessa virtualidade a minha escolha em criar este blog e transformar este espaço num lugar onde as trocas via internet favorecerão a construção da coreografia/projeto e ajudarão durante todo o processo criativo.


Quero perceber no meu corpo/dança como será esta contaminação, da mesma forma como acontece nas relações de corpo/desejo entre as pessoas que vivem essa realidade/virtualidade.


A palestra de Lia Crespo pode ser encontrada também no site http://debpedroso.wordpress.com/ de minha amiga, Debora Pedroso que já tem contribuido com a minha pesquisa.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Entrevista com Simone Bichara




Simone Bichara é uma amiga muito especial, vem do Acre e semeia delicadeza, amor e generosidade pela Terra, pelo Homem, pelos seus amigos. Com uma história de vida rica que mistura-se com as histórias de seu lugar, é um papo dos mais agradáveis e gostoso de se ganhar o tempo. Ela ainda pinta maravilhosas Mandalas e tem exposições em diversas partes do país.


Floresta

Alvorada


Alma


Acesse também http://www.cartadaterrabrasil.org/prt/index.html

A espera

Não há coisa mais insuportável do que a espera. Perdemos tempo, energia, passam-se oportunidades enquanto estamos a esperar. Esperar o táxi que não chega no horário, esperar o amor que não veio quando imaginávamos, quem sabe depois do tempo da delicadeza, esperar a funcionária do banco abrir a porta para deficiente, esperar a fila do banco, esperar a máquina dizer que não consta nenhum depósito na sua conta.


Aí você conta até dez e repete a operação. Não, não consta nada mesmo. Aliás, consta as inúmeras correspondências que o banco envia te informando que o saldo está negativo, mais precisamente R$ 40,47 negativos. Acho importante declarar os valores aqui porque se trata de Edital do Governo, então tem que estar tudo bem esclarecido.


Em fevereiro fui informado que as diligências do projeto foram aceitas e estava tudo ok para a assinatura do TAC (Termo de Acordo e Compromisso). Nessa época tive que abrir a conta do projeto para enviar a FUNCEB que enviaria ao Fundo de Cultura. Pois bem, meu povo, resumo da ópera. Só assinei o TAC em Junho com a promessa de depósito início de Julho, já estamos em meados do mês e nada feito. A conta só aumenta o tom do vermelho e essa dívida terei que pagar do meu próprio bolso, porque o Estado não se responsabiliza pelas taxas bancárias.


A FUNCEB me informou que o dinheiro já está disponível para o depósito, só não sei por que o Fundo de Cultura não deposita. Quem faz projeto sabe que o orçamento é regrado, temos que fazer mágica para que o dinheiro seja suficiente para o trabalho, com as taxas altíssimas do banco e sem o depósito no tempo certo, algo do projeto terá que ser sacrificado. Sabe o que eles dizem? Que terei que tirar de alguma rubrica pessoal, ou seja, do meu salário mesmo, porque se eu tirar de um outro ítem tem que justificar e eles não aceitam esse tipo de pagamento.


Ficamos radiantes com as vitórias dos nossos projetos, acho que tem muita coisa positiva no campo da Dança, mas esse lance do repasse do dinheiro dos Editais nos deixa nervosos, tensos, preocupados. Ninguém toma uma providencia para agilizar o baba. Enquanto isso, o projeto já começou, porque assinamos o TAC e temos que iniciar imediatamente, independente se dinheiro saiu ou não. Já estou tendo reuniões com o pessoal do cenário, música, figurino, produção. Já estamos fechando com o espaço para ensaio, enfim... o projeto anda dentro dos TERMOS, conforme o ACORDO, mas o COMPROMISSO do pagamento não chega.

sábado, 10 de julho de 2010

A guerra me perturba



O jogo da final da Copa do Mundo parecia uma guerra. Jogo feio, muito violento. Eu havia postado este clipe ontem e faço questão de homenagear os jogadores da Holanda e Espanha com este clipe. Guerra, violência... Nada muito diferente do que a História nos conta sobre esses povos, né?


Aqui o vídeo do Grupo Department Of Eagles - No One Does It Like You


Fui presenteado com este vídeo por Bruxa Lacerda. Vim colocar imediatamente aqui.

Os Participantes

O projeto O Corpo Perturbador foi vencedor do Edital Yanka Rudzka 2009 - Montagem de Espetáculos de Dança, da Fundação Cultural do Estado da Bahia.


A coreografia, concebida por Edu O. será dividia em três partes de no máximo 10 minutos, interrelacionadas, tendo a Direção Artística da coreógrafa, dançarina e professora Fafá Daltro e a consultoria, à distância, do coreógrafo e pesquisador Wagner Schwartz dando orientações teóricas à pesquisa. Contaremos também com colaborações espotâneas dos amigos frequentadores do blog. Alguns já começaram a colaborar com palavras e vídeos, a exemplo de Clênio Magalhães que enviou um vídeo ótimo que será publicado em breve e através dos comentários poderão dar sugestões e opinar sobre o projeto.


Durante os meses reservados a criação de cada cena, um dançarino com deficiência, estagiário, selecionado em audição, fará parte da pesquisa estimulando diálogos e provocando o intérprete a encontrar outras fontes de referências corporais que possam enriquecer seu repertório de movimentos. Num encontro de corpos semelhantes.


O projeto contará, em todas as suas etapas, com a participação de uma monitora, Diane Portella, que auxiliará o dançarino Edu O. e o estagiário nos exercícios da pesquisa, dando suporte necessário a sua elaboração.


A trilha sonora será criada pelo compositor Cássio Nobre, especialmente para o espetáculo. O cenário será criado pelo pessoal da Miniusina de Criação.


O projeto para aproveitamento da luminosidade do ambiente escolhido para as apresentações ficará a cargo de Milianie Matos e o figurino será uma criação de Nei Lima.


A produção ficou com a Ampla Comunicação Total, as fotos com Alessandra Nohvais e o design com a AF Design Comunicação.


Como parte do trabalho desenvolvido serão realizados, no ambiente de ensaio, fóruns de discussão, intitulados Papo Perturbador, com profissionais especializados – sexólogos, fisioterapeutas, psicólogos e público convidado – que terão como objetivo precípuo a elucidação das questões abordadas no trabalho, principalmente àquelas relativas ao “devoteísmo”, fenômeno ainda muito pouco estudado no cenário nacional.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Entrevista Baby do Brasil



Baby do Brasil é uma das mais importantes cantoras brasileiras, fazendo história tanto em carreira solo e junto ao grupo Novos Baianos. Para mim é uma referência de criatividade, musicalidade, irreverência. Cantora de inúmeros sucessos como Menino do Rio, Brasileirinho, Sem Pecado e Sem Juízo, Cósmica, Telúrica, entre outros....


Baby me concedeu esta breve entrevista após um show inesquecível que fez com Elza Soares e Ademilde Fonseca, em São Paulo. Muito simpática, aberta e delicada, falou sobre o que a perturba e o que é um corpo perturbador de forma bastante consciente e bela.


A poesia de Baby do Brasil abre a sequência de entrevistas que tenho feito com inúmeras pessoas de diversas áreas, profissões, lugares e corpos. Acho que esta ação do projeto O Corpo Perturbador será um sucesso e poderá contribuir para ampliar a discussão sobre a pesquisa desenvolvida nesse trabalho.


As entrevistas serão disponibilizadas nas sextas, segundas e quartas-feiras.


Estamos recebendo depoimentos de quem se interessar em contribuir com o trabalho. Basta fazer um video, em câmera digital mesmo e enviar para o email eduimpro@gmail.com

Ed Andrade, Edu O. e Baby do Brasil

quinta-feira, 8 de julho de 2010

As curvas das Gabrielas e dos Vadinhos


Revistas de moda e beleza – sentado sobre estas revistas um corpo invisível vê-se em postais da cidade. Imagina-se! Pensa na sinuosidade e pensando em curvas sabe-se sedutor. A curva dos quadris, das cinturas e seios de tantas Gabrielas que passam por ele e das bundas de outros tantos Vadinhos.

Sua sinuosidade é outra, é para outros desejos. As curvas de sua coluna em S atraem outra platéia e incita um outro olhar. Sabe-se sedutor.

O devotee deseja suas pernas, suas costas, seus pés pequenos, suas próteses. O devotee devota.

No lugar da brejeirice das ancas fartas, uns invisíveis se acomodam em jornais e deitam e sonham com a vida de revista.



É com euforia que começamos os trabalhos para a criação do meu próximo solo, intitulado O Corpo Perturbador, com estréia prevista para Novembro de 2010.
 
Este projeto traz uma abordagem diferenciada sobre o corpo que é considerado incapaz, não-belo, perturbador: o corpo com deficiência, fora dos padrões do pensamento hegemônico. Numa sociedade imensamente erotizada, acredita-se ser pertinente instigar uma outra reflexão sobre o assunto, abordando, a partir dos devotees , a sexualidade neste corpo, assim como as relações de poder intrínsecas nas relações afetivas, sociais, políticas, culturais e religiosas que envolvem as pessoas com deficiência.




Devotee é uma categoria de pessoas que têm fetiche pela deficiência. O que lhes atrai é a deformidade, é a especificidade de cada deficiência. Neste trabalho pretende-se, ainda, questionar e problematizar o desejo num mundo onde a existência de um padrão é cada vez mais valorizada, mas que ainda existem pessoas que andam na contra-mão.


Entendemos o corpo como estrutura e significados que surgem a partir das imagens construídas por/com ele. O corpo aqui reduzido e representado pela coluna e sua escoliose, pelos inúmeros ajustes que o corpo faz para se equilibrar, fazendo-se, então, um paralelo e uma analogia entre os ajustes sociais e os ajustes físicos. A partir da sinuosidade das linhas deseja-se criar imagens significativas. As linhas sinuosas revelam sensualidade e provocam desejos. Minha coluna tem uma linha muito forte que não é a ereta.


Não é uma experiência para estreitar o entendimento, mas para ampliar a percepção sobre o humano, sobre as possibilidades do corpo, dos estados do corpo enquanto ser biológico, cultural, co-autor e responsável pelas coisas do mundo, chamando a atenção de que as convicções que esses corpos não possuem os padrões apropriados para dançar sustentam o apartheid que interdita a possibilidade de que a sua dança seja encarada como a outra dança, aquela que produz conhecimentos.


*As fotos deste post são de Alessandra Nohvais, trabalhadas por Anderson Falcão da AF Design