terça-feira, 27 de julho de 2010

Os Bichos de Lygia no meu Corpo

Desde o primeiro momento em que pensei neste projeto tive vontade de pesquisar a obra de Lygia Clark, especialmente a série Bichos pela dessacralização da obra de arte e pelos seus movimentos que desejei trazer para o meu corpo. Lendo mais sobre este trabalho percebi que era perfeito como fonte de pesquisa para o que pretendia por tudo que ele significa e pelo discurso que pretendo trazer com o Corpo Perturbador. Abaixo dois textos que selecionei na época em que nem havia pensado no edital, mas já me contaminava com Lygia. Tanto que em 28/05/2008 escrevi um email para Wagner Schwartz falando sobre os Bichos, trabalho que eu não sabia ele havia pesquisado também:

Wagner, meu deli, só hoje tive a 'brilhante idéia' de pesquisar no google para ver se vc tinha site. eita burrice!!!! estive passeando por ele e vi a referência aos bichos de Lygia Clark. Não sei o que é isso, mas quando pensei nesse trabalho dela, na verdade eu nem conhecia direito. Fiz Artes Plásticas, mas na época me interessava por outras coisas e nunca fui um estudioso de Lygia. Pensei na cena que queria e me veio a imagem dos Bichos. Pesquisei e descobri que penso arte muito semelhante ao que ela dizia, sentia... Fiz, inclusive, especialização em Arteterapia. Penso em você para me ajudar na idéia da cena do Bicho e você já tem algo refrente a isso. As coisas vão se agrupando, né? Acho ótimo!!!


Abaixo dois textos que selecionei naquela época.

Lygia Clark em 1960, ela criou obras que podiam ser alteradas pelo espectador. Eram chapas de metal articuladas por dobradiças, que a artista chamou de Bichos e que assumiam formas diferentes após a manipulação para a qual os espectadores eram agora (ao invés de proibidos) convidados. Essas obras são revolucionárias, pois foi a primeira vez que o público podia modificar uma obra de arte, quebrando com os conceitos de aura, sacralidade e autoria única, solidificados desde o Renascimento

1978 - O fio condutor desse fase da sua obra é a relação entre corpo humano e arte. Seus “objetos relacionais” são uma série de manipulações artísticas que ancoram sua obra no universo de uma arte construída a partir do espectador/paciente. O processo terapêutico se irradia nas duas direções: na cura do sujeito/paciente que participa do processo da obra e na emancipação da obra de arte do seu status de objeto/produto. Segundo ela própria, quando o objeto perde sua especificidade como mercadoria/produto/obra e adquire significado na sua relação com a estrutura psicológica do sujeito, então a arte acontece e a possibilidade de cura aparece.

Ana Maria Caetano de Faria

http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/lygia-clark/lygia-clark-2.php



O texto abaixo foi escrito por Aléxia Bretas em seu blog Dimensão Estética

Contra a concepção marxista da arte como pura ideologia, Marcuse, em um de seus últimos ensaios, escreveria: "Toda a verdadeira obra de arte seria revolucionária, na medida em que subverta as formas dominantes da percepção e da compreensão, apresente uma acusação à realidade existente e deixe aparecer a imagem da libertação" (Marcuse, 2000, p. 13). Sem injustiça, de tal natureza é a prática artística de Lygia Clark. Intuitivamente solidária à premissa que admite o viés entre a arte e a política, seu trabalho investe no potencial emancipatório de uma dimensão estética transformada. Daí, já em 1968, ela afirmar: “Se eu fosse mais jovem, faria política” (Clark, 2006).

Clark – que teve uma iniciação relativamente tardia nas artes, aos 27 anos de idade – assina, com Ferreira Gullar e outros seis artistas, o Manifesto Neoconcreto, de 1959. Logo de saída, a expressão “neoconcreto” é apresentada como uma “tomada de posição” frente à arte “não-figurativa”, e particularmente à arte concreta, comprometida por uma “perigosa exacerbação racionalista” (Gullar in Clark, 2006). Dispostos a corrigirem os equívocos produzidos por uma noção mecanicista de construção, derivada de uma atitude cientificista, de extração gestáltica, os neoconcretos defendem o primado da obra sobre a teoria, reivindicando o privilégio da sensibilidade sobre a razão. E garantem: “Ou bem a profecia de uma total integração da arte na vida parece-nos possível (...), ou essa integração nos parece cada vez mais remota e a sua obra se nos mostra frustrada” (Gullar in Clark, 2006). Ao retomarem o projeto de dissolução da arte na vida propalado pelas primeiras vanguardas, figuras como Amílcar de Castro, Ferreira Gullar, Franz Weissmann, Lygia Clark, Lygia Pape, Reynaldo Jardim e Theon Spanúdis repõem o problema estético em nova chave, subvertendo as categorias de espaço, tempo, forma, estrutura e cor, em nome de uma experiência artística totalmente re-significada.

Que se recorde que de 1954 a 1956, Clark já havia realizado outras quatro exposições com o Grupo Frente – do qual faziam parte também Lygia Pape e Hélio Oiticica. Durante estes anos de pesquisa “geométrica” – em grande medida, inspirada em Mondrian –, os limites da representação pictórica são radicalmente esgarçados, pela tentativa, sempre renovada, de enfrentar a “crise do retângulo” com a superação da própria bidimensionalidade do quadro. No caso de Lygia Clark, as Superfícies Moduladas (1956-1958) correspondem à solução encontrada para o aparente esgotamento do plano e, vistas em retrospecto, representam seu primeiro passo para fora das fronteiras do objeto como tradicionalmente concebido.

Tanto que o estudo clarkiano da linha orgânica resulta na criação dos Casulos (1959) e, mais tarde, de suas célebres chapas de metal articuladas por dobradiças, a propósito, batizadas de Bichos (1960). A própria artista explica que tais “contra-relevos” ou “neo-objetos” são como um organismo vivo, “uma obra essencialmente ativa”. Ela continua: “Uma integração total, existencial, é estabelecida entre ele e nós. (...) Na realidade, trata-se de um diálogo em que o Bicho reagiu às estimulações do participante. [Portanto], esta relação entre obra e espectador – antigamente virtual – torna-se efetiva” (Clark, 2006). Ao colocar em xeque os protocolos da contemplação passiva, Lygia é pioneira em promover a participação do público como condição de possibilidade do próprio “acontecimento” artístico."

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