segunda-feira, 18 de julho de 2011

Depois que cortei o cordão

Quando começo a entrar em crise penso logo em voltar para Santo Amaro. Como criança arrependida de ter cortado o cordão, estourado a bolsa, cansada de nadar ali dentro. Sempre que isso me acontece vem a vontade de chorar como um filho que largou a casa por rebeldia, abandonou a família e agora pede para voltar. Mas as coisas lá na minha cidade não são muito favoráveis e assim como o grande Gonzagão cantou em A Volta da Asa Branca, "a seca fez eu desertar da minha terra" e me forçou a buscar água pelos lados de Salvador e essas águas foram me levando para o mundo. Agora é difícil voltar para lá porque a seca continua. A falta de perspectiva para os filhos da terra é cada vez maior, a saúde se encontra numa situação calamitosa, a educação, a violência que tomou conta de toda parte e antes parecia que não atingiria aquele sagrado chão, hoje destrói os jovens como a enchente de 1989 destruiu casas, ruas, praças...
Santo Amaro vive uma seca cultural. É doloroso não ter o que fazer e ver uma população apática, recebendo de bom grado as migalhas que lhe oferecem. A politicagem acabou com o compromisso pela melhoria do lugar e cada um se preocupa apenas com o seu quintal, esquecendo de limpar as ruas, os espaços públicos, os espaços de encontro. Quando retorno a Santinho me dá tristeza ao ver que não há mais conversa no adro da igreja, não há Ângela Rô Rô inundando a praça saindo do maravilhoso repertório do Satolep, não há a lambada do Veleiro, não há mais tanta coisa. E não é saudosismo de quem não se adpta à mudança dos tempos, sempre acompanhei tudo da cidade, mas agora está difícil. A falta de opção é o maior problema ao meu ver. Ou você ouve pagode e arrocha ou ouve pagode e arrocha. E ai? Ou você vai para pagodão na AABB ou vai para pagodão na AABB? e ai? Sou da bagaça, filho da chulinhagem, mas tabém curto música com letras e arranjos bem elaborados. Sou fã de Edu Alves, Stella Mares, Márcio Valverde e Lívia Milena. Roberto Mendes o mestre entre os todos. Quero espaço e festas lotadas para eles. Reverenciar os que pensam, os que refletem, os que nos dão possibilidade de pensar melhor. Adoro brincar, mas tem hora em que a vida pode ser leve e séria.
Que vontade de voltar para minha casinha, na Nova Sto Amaro, dormir de janela aberta, cruza a rua e visitar Paula, receber Elisa, gritar Miriam, beber com Fau. Por falar em beber, há um portal ainda guardado a sete chaves e à mostra de todos: o bar de Tote. Espero que não se contamine com a água infecta da mediocridade que desce pelas nossas torneiras. "Quem sai da terra natal Em outros cantos não para" (Último pau de arara)
Para aumentar a saudade, publico Bethânia cantando Gonzagão

3 comentários:

  1. Um dia hei de ir a Santo Amaro purificar os olhos. beijoss

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  2. Meu amigo, não teve uma única vez que eu tenha ido a Bonja sem ter dado uma voltinha pelas ruas de Santo Amaro. Ainda preserva um imã que nos atrai e nos acalma quando a gente percorre aquelas ruas, ainda que maltratadas e imundas. Fiquei triste com a descaracterização da praça. Cortaram tantas árvores... Nem vou falar mais nada. Me poupe, viu?

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  3. Doces tempos... Será que ainda dá para chupar cana na Caieira? Lá na beira do rio...
    Será que dá, ainda, para desbravar aquele lindo matagal da Nova Santo Amaro atrás de porcelanas portuguesas?
    Ou até cachorros mortos...
    Hum... Ainda dá para sair descalça e invadir aquelas terras procurando gentes até o infinito, mesmo sabendo que ficaria de castigo por um mÊs...
    O preconceito, o crack, a corrupção... a mediocridade, tomaram tudo?

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