Preciso ter muito cuidado com o que vou escrever para não ser mal interpretado, para não parecer ressentimento de excluído ou ainda para não parecer arrogante. O que me faz escrever este texto é justamente o contrário. Pensei sobre isso durante toda temporada do meu espetáculo O Corpo Perturbador e escolhi publicar no final das apresentações porque precisava me certificar de que minhas impressões estavam certas. Aqui não vai nenhuma queixa em função de pouco público o que, aliás, não aconteceu. Nosso projeto previa uma platéia de no máximo 30 pessoas por apresentação e tivemos diariamente uma média superior a previsão, tendo dias de chegarmos a mais do que o triplo do planejado. Então não é mágoa de artista abandonado pelo público. Nem tampouco um criador em crise pela falta de compreensão de sua obra. Quem esteve presente ontem no ICBA percebeu através da fala das professoras Lúcia Matos, Fafá Daltro e Iara Cerqueira a abrangência do trabalho. Quem lê os comentários no blog e no facebook pode ter uma vaga idéia de como o espetáculo atingiu seu objetivo. O que quero escrever aqui é sobre o abandono da imprensa baiana. A mídia daqui mais uma vez negligencia os trabalhos produzidos pelos pequenos artistas locais. Nenhum jornalista teve a mínima curiosidade em conhecer a proposta que trazia um tema diferenciado, inédito e relevante na cena contemporânea. Não sou eu quem fala essas palavras, repito apenas o que escutei ao longo das apresentações.
Mandamos release para todos os meios de comunicação e apenas Rita Batista, no seu programa Boa Tarde Bahia da Band, nos cedeu espaço na primeira temporada para uma entrevista. O resto foi apenas inclusão na agenda do final de semana dos jornais impressos com Ctrl+C e Ctrl+V do resumo que mandávamos. O que mais me incomoda é ver a mídia valorizar assuntos que, ao meu ver, não são tão importantes assim e ocupam um tempo enorme dos telejornais e programas. Pode ser que o que nós queremos falar também não seja tão importante quanto eu penso, mas se é por “desimportância” por que não dar um pequenino espaço para produções locais independetes?
Acho importante falar da questão da produção independente porque quando este mesmo artista participa de um evento produzido por algum teatro ou produtor maior, a mídia escancara os dentes e abre suas portas. Foi assim com meus outros dois espetáculos Judite quer chorar, mas não consegue! e Odete, traga meus mortos, quando participei do Festival Vivadança produzido pelo Teatro Vila Velha. Estive em todos os programas locais e em matérias de jornal. Lógico que um festival desse porte deve ter um espaço enorme nas grades dos programas e nas pautas dos jornais. O que questiono também é por que não ceder espaço para aqueles que não tem como pagar assessoria de imprensa? Que não tem conhecidos entre os profissionais de jornalismo? Por que não se interessar pelo que é produzido na cidade?
Hoje o Bahia Meio Dia da TV Bahia gastou minutos preciosos com o povo cantando Dar uma fugidinha na porta do ensaio da Timbalada. Depois mais outros longos minutos com o cantor Michel Teló cantando suas preciosidades. Mais uma vez acho que não é preciso excluir nada das pautas, até mesmo porque interessa ao povo, mas porque não dar oportunidade a este mesmo povo de ter acesso a coisas diferentes? Ele poder optar e ser responsável por seu próprio gosto? Na terra do Axé se produz cultura de qualidade, dança, teatro, performance, artes plásticas, audiovisual. Temos uma diversidade de corpos e cores e sons e gente. Fico muito triste pela invisibilidade dos artistas daqui. Vejo amigos (até mesmo da música) sofrerem de abandono pela imprensa porque aquele trabalho, supostamente, não interessa e não renderá o lucro esperado. Friso a música porque teoricamente é a área queridinha da mídia.
Compreendo que há falta de informação da maioria dos jornalistas, da preguiça em ser desafiado com assuntos que lhe fogem o domínio, da burrice instalada pela cultura do axé, da importância do lucro fácil, vejo como são rasas as matérias que não se aprofundam no assunto, percebemos a supervalorização do escândalo e das aberrações, mas penso que passou da hora de repensarmos essa carnavalização toda, porque o bicho está pegando na Cidade d’Oxum e pelo andar da carruagem o “jeito é dar uma fugidinha”, e desse jeito a gente só se “foge”.
revoltante mesmo edu! a mídia televisiva da bahia é surreal. são capazes de ficar o horário disponível inteiro com uma pauta sobre manifestação religiosa intercalada com uma banda de pagode no estúdio. a impressa não fica atrás. abra a programação cultural de qualquer jornal daqui que vc só vai ver batucada. é lastimável. eu e a equipe do média metragem "fuga" passamos por um descaso parecido. a estréia do filme só foi um sucesso porque divulgamos através do boca-a-boca, blogs, redes sociais e e-mail.
ResponderExcluirARRAZOU EDÚ...
ResponderExcluirPARECEU PACIFICO NO INICIO, MAS DEU O RACADO COMO IMAGINEI QUE FOSSE DAR NO FINAL.
A CLASSE ARTISTICA PRECISA SE MOBILIZAR CONTRA TODA ESSA CONFIGURAÇAO MIDIATICA QUE SÓ EMPOBRECE NOSSA HISTORIA, VAMOS FAZER VALER NOSSA VOZ, ESSE CORPO QUE É MIDIA TAMBEM, E SEMPRE ESTA A FAVOR DOS NOSSOS INTERESSES.
QUANDO TERÁ FIM TODO ESSE DESCASO?
COMO DISSE HOJE CEDINHO DANIELA PRATA " PRECISAMOS URGENTE DE UMA NOVA ORDEM SOCIAL"
DEVO CONCORDAR COM ELA.
Pois é, meu caro.
ResponderExcluirA mídia baiana chega a ser engraçada
(quem mora na Bahia e tenta assistir à TV local após o meio-dia sabe do que falo).
Tudo se resume a bárbarie e ensaios de verão.
Agora restam-nos "fugidinhas" e "foge, foge".
E ainda vem aí o carnaval...
"O corpo pertubador" como case
ResponderExcluirde reação à exclusão na mídia
Edu O. tem razão. Todo artista sabe o quanto a divulgação é um quesito fundamental de toda e qualquer produção. Mas não é exclusividade da área cultural esse "descaso". O problema é que a montanha (quase) não se move. Lembro de produtores - não eram jornalistas - que diariamente iam (suponho que continuem indo) à redação de A Tarde, por exemplo, com os releases dos espetáculos (musical, teatral, exposições... o que fosse) em que estavam envolvidos, para garantir a divulgação.
No âmbito da política e manifestações populares (exceto quando põem fogo em ônibus e pneus, paralisam vias públicas) ocorre da mesma forma. Mas há tempo e espaço para muita abrobrinha, sim. Irrazoável e ab-surda-mente, sim. Desjornalisticamente, sim.
Com toda a disponibilidade e alcance da Internet (sites, blogs, redes sociais), considero esse tipo de busca de "espaço" nas mídias convencionais, hoje, menos importante que era há duas, três décadas. Mas é claro que não se deve descartar a inserção social amplificada (penso nas tevês) e o registro histórico (como é o caso dos jornais), como forma de informar e mobilizar público.
Mas é incrível, também, que não se busque, na "montagem" de um produto artístico, estabelecer relações com jornalistas. Os artistas para com os jornalistas da área cultural (e vice-versa): têm que ser mais articulados. Os produtores têm que enviar releases e convites, sim. Mas é phoda. Ultimamente, vejo "n" releases (e não são meus não) sendo apropriados (assinados) pelos coleguinhas das redações.
A montanha (quase) não se move. É Maomé quem tem de ir aonde a mídia está. Saculejá-la. Participei, ano passado, da iniciativa de Leonel Mattos em promover uma intervenção artística na Feira de São Joaquim. Dezenas de artistas baianos participaram com performances geniais. Uma intervenção no cotidiano da cidade. Agendei jornais, tevês. Reforcei no dia do evento. E nem uma linha, exceto na revista Lícia Fábio...
Tudo isso me fez lembrar a invasão da redação da Folha de S. Paulo, em meados dos anos 80, por José Roberto Aguillar e sua troupe. Subiram nas mesas, cantaram, pintaram e bordaram. Sugiro que os artistas baianos sigam o exemplo. Invadam as redações!! Essa sim é tarefa digna de um verdadeiro "Corpo Pertubador".
Re (d) ações.
Albenísio.